COLUNA DO MEIO…
“LA FAUTE À LULA”
No final dos anos 80, o filósofo francês Félix Guattari, ao analisar o quadro social em meio às transformações significativas que aconteciam no mundo, dizia que as relações da humanidade com o socius, com a psique e a natureza tinham uma tendência a se deteriorar. Não apenas devido às degradações que as pessoas submetiam ao ambiente e eram ao mesmo tempo submetidas, mas também pelo fato da existência do desconhecimento, da passividades dos indivíduos e das instituições que compunham aquele conjunto.
O “negativismo”, o fatalismo exacerbado e a culpabilização — uma das funções da subjetividade capitalística (Guattari) — ainda trabalham juntos nas diversas instâncias sociais. Aparentemente, só resta uma entrega à reprodução de discursos de vitimização às instâncias de superego e inibição. E assim a mídia seqüelada brasileira se junta à Direita Infantilizada, colocando em prática outra função da subjetividade capitalística: a segregação. Elas mostram o quanto há de preconceito, inveja, desespero e medo de ter um presidente-operário e uma ministra do meio ambiente que veio dos distantes seringais (nascida numa localidade chamada Breu Velho, no seringal Bagaço, a setenta quilômetros do centro de Rio Branco) acreanos.
As concepções negativas e catastróficas relacionadas ao “embate ambiental” são redesenhadas pela mídia e utilizadas como mecanismo de desinformação, reforçando essa segregação e a falta de comprometimento político. A “estimulação pelo desespero” é o que impulsiona as falsas críticas ao Programa de Aceleração do Crescimento – PAC do Governo Lula, e as conseqüências das obras na Amazônia. Agora o possível desaparecimento da Floresta Amazônica, previsto para daqui a 50 anos, tem um novo vilão.
A culpa é do PAC, ou melhor, do Lula. “C’est la faute à Lula”. Uma parte dos que reforçam o discurso segregador da mídia parecem estar na mesma condição inicial da menina Anna de La Mesa, personagem do cinema “A culpa é do Fidel” (La Faute à Fidel, 2006), de Julie Gavras. Agora os vilões do desmatamento são o agronegócio, a exploração madeireira e a expansão da malha viária amazônica. Não seria um medo ligado a um possível desenvolvimento econômico da Região Norte?
Enquanto os cientistas (ingleses, americanos, franceses, até mesmo brasileiros) se esforçam para fazer projeções pessimistas, não há o mínimo interesse na produção de uma existência humana em novos contextos históricos. Mas sim na proliferação de “palavras de ordem estereotipadas, reducionistas, expropriadoras de outras problemáticas mais singulares” (Guattari). Os mecanismos da subjetividade capitalística tentam tirar a atenção do que realmente é para ser discutido e, assim, os cientistas, que aparentemente assumem uma posição neutra, contribuem para o arranjo do cenário terrorífico e o lucro de instituições bancárias e seus fundos para institutos para o desenvolvimento sustentável, o que é um grande negócio.
Após as medidas do Governo Federal para combater o desmatamento no Mato Grosso, a solução imposta pelo senador Jonas Pinheiro (DEM-MT) foi a retirada do estado da região caracterizada como Amazônia Legal. E seu projeto já foi aprovado em uma das comissões do Senado em 2007. Esse projeto defende que o Mato Grosso não possui bioma característico da Amazônia. O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária mato-grossense, Rui Prado, apóia o projeto, já que “as pessoas que acompanham a mídia ligam Mato Grosso com Amazônia. E isso não é a realidade”. Mas para o IBGE, o Mato Grosso tem quase metade do território em área de bioma da Amazônia. Junto com ele, o deputado federal Osvaldo Reis (PMDB-TO) propõe que o Tocantins também deve ser retirado da Amazônia Legal pelo mesmo motivo e ainda reforça dizendo que o estado fica impedido de progredir economicamente: “Não temos área suficiente para produzir porque o estado está na Amazônia Legal sem ter áreas de mata”.
Se depender dos ferrenhos defensores da Amazônia, ela não vai suportar muito tempo. Afinal, não há diferença entre o discurso de um madeireiro/poluidor e um ongueiro/cientista/ambientalista, já que todos eles ainda abordam as questões apenas numa perspectiva tecnocrática e são totalmente incapazes de discutir a problemática numa permanência ético-política. Primeiro, porque ainda não desenvolveram uma concepção política; segundo, porque para eles o ético se constitui nos registros reducionistas da oposição BEM versus MAL, no qual o Bem sempre vence, só não se sabe quem representa o bem e o mal na fantasia da semiótica capitalística, que faz tudo no sentido de calar e impedir qualquer tipo de emancipação e mudança.