CONVERSA COM SEU BAIANINHO DO TAMBOR-DE-MINA
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No sábado passado fomos até a casa de Pai Miguel de Vondoregi para conversar com o encantado Baianinho do Tambor-de-Mina. No momento em que publicamos essa conversa e algumas descontraídas imagens do encontro, Pai Miguel já se encontra em São Luís do Maranhão, para participar das festas de comemoração dos 50 anos da Casa da Fé em Deus, sua casa. Seu Baianinho é a primeira entidade das Minas que conversamos. Com uma voz possante, metálica, e sotaque arrastado, bem humorado, perspicaz, contagiante, ele nos falou sobre si, sobre os conhecimentos das Mina, a relação dela com as outras religiões afro, teceu lúcidos comentários o papel das religiões em geral, e até, quando conversamos sobre o Bumba-Meu-Boi do Maranhão, o verdadeiro boi, e lhe falamos do boizinho afinado Rizoma, ele se comprometeu a participar de uma apresentação. Com a participação da Isá Donquê (correspondente à Mãe Pequena do Candomblé) da casa, Taíssa, de Seu Marinheiro e a filha mais nova foi agradável a conversa que ora deixamos aqui…
Ero sou um encantado chamado Baianinho. Sou chamado, não é meu nome. Dentro das Mina, da Umbanda, dos encantados de Angola, todos nós damos um nome que vocês chamam pra cá de apelido. O nosso nome é uma coisa que dentro das obrigações, dentro da família de santo, nós usamos; fora dali nós temos dito de várias formas. Você vai encontrar caboco, encantados: Ave-Seca, Rompe-Mata, a própria encantada chamada Mariana; Mariana não deixa de ser um nome que ela botou, mas ela tem o nome dela. Quando chega nessa parte de nome, todos nós temos um nome. Todos nós temos uma descendência. Nas Minas, ela é dividida em famílias de encantados, como também têm cabocos.

Na Mina tem famílias de gentis, que vem ser Dom Luís, Dom Sebastião (também conhecido como Rei Sebastião, Dom Manuel, Dom Miguel, várias famílias. Aí vem, pelo lado da encantaria, João da Mata, conhecido como caboco da andeira ou caboco rei da bandeira, tem a família dos Bastos, que é uma família húngara, que foi encantada no juncal…
O junco virou
Na lagoa virou junco
O junco virou
Na lagoa do juncal
…tem a família de Dom Miguel, Rei da Gama, que é uma família que vem da Espanha, tem a família de Dom Sebastião, de Portugal, que foi encantado nas águas do Maranharo, tem a família de Légua Mogiboá, com encantaria no Codá, que também vem dos Áfricas. Então, são várias famílias dentro da Mina. Seu Marinheiro tem a família dele, família da marinha, dos marinheiros, o qual tem um que eles chamam de Pai. Tem a família dos Botos, governada por João de Lima, encantado peruano que desceu pelas águas do Amazonas e fez encantaria dele no Pará, tem a família da Baía, que é a minha.
Não sou da Bahia de São Salvador. A nossa Baía é baía. Às vezes eu canto para a Bahia de São Salvador como respeito, como uma saldação. (Seu Marinheiro canta)
Eu não sou daqui
Marinheiro sou
Eu não tenho amor
Marinheiro sou
Eu sou da Bahia
De São Salvador
Aqui [em Manaus] tem encantarias bonitas, que o povo daqui não sabe, porque encantou-se aqui, mas desceu e foi fazer encantarias em outras águas. Como alguns desceram de outras águas e vieram pra cá. Nós somos de uma baía. A única família que é verdadeira maranhense chama-se a família do Codó. Não tem a família dos turcos? Mas o chefe da família já é cambinda. E assim vai.
Eu não tive vida terrena. Nãro, nãro. Alguns encantados tiveram vida terrena. Se você fizer alguma leitura, vai encontrar muita coisa do povo que teve vida terrena e se encantaram, não morreram, porque dentro da Mina não tem como morrer. O se encantou ou já veio encantado para o mundo. O senhor não conhece estas histórias: “Ah!, o fulano sumiu.” Como sumiu? Morreu afogado e nunca mais encontraram o corpo. Não morreu afogado; teve encante, se encantou. E isso tem. O povo pode até não acreditar, mas tem. Tem muitas coisas. O senhor vai se perder um dia só em querer saber. Às vezes nem o próprio pai de santo sabe. Ele sabe se atuar. Recebi num sei quem, mas não sabe nem quem é aquela entidade, aquele espírito que ele tá recebendo.

O senhor pensa que esse pessoal que recebe espírito e vira evangélico recebeu encantado algum dia, recebeu caboco? Recebeu um espírito obsessor dando o nome de encantado, de caboco. Sabe o que acontece? O senhor chega na minha casa: “O seu nome é Mariana, seu nome é Mariano, é Balanço.” E ali o pai de santo não viu que pode ser uma energia negativa, um espírito obsessor. Aí bebe, fumar eu sou o tão, aí a vida da pessoa vai pra [sinal para baixo], aí vai pras igreja. A igreja reza, a reza tem poder, tira aquele espírito obsessor, Mariana, Pombagira… Nunca foi nada disso coisa nenhuma. Nas casas de religião africana também se tira espírito obsessor, tem ebó, tem limpeza, tem banho de descarrego para tirar energia negativa. Agora o que que acontece, eu quero minha casa cheia, então eu não quero nem saber. Às vezes o pai de santo não tem visão, é por isso que tá essa marmotagem todinha.
Nós somos Nagô. Não tem encantado Jêjo. Na Jêju só tem vodun, e é dividido por família: família de Savaluno, Damirá, Davisse, Quevê Osô… Cada família tem os seus voduns. Nós todos somos Nagô, porque o Nagô abraçou a todos. Você vai ver que tem orixá que chega dentro do Nagô e dá nome português, mas se você for ver é o mesmo orixá, ele é um vodun, só que de uma outra água. Têm os cambindas, têm os cachéus, e têm voduns, mas que estão no Nagô, dentro do Jêjo não estão. O Ketu não tem vodun, só vira orixá. Mas tem muito orixá do Ketu que é Jêjo: Oxumaré, Nanã, Euá, todos são Jêjo, mas migraram. O próprio Nagô, Nagô Abioton: dança vodun, você vê orixá dançando e vê encantado dançando, todos naquela mesma alegria.
A origem das Mina vem dos África, vem o Jêjo de Benin e da Nigéria vêm os Nagôs. O nome Mina é porque os negros que vinham para o Maranhão saíam do porto de São Jorge del Mina, na Costa do Ouro. Quando chegavam no Maranhão, diziam assim: “Chegou os negros mina.” E esse nome, Mina, ficou. Pra Salvador foram os ketus, os marris, todas tribos com dialetos diferentes. No Maranhão é o Jêjo, com a língua Euê. Lá em Salvador tem o Jêjo Marri; tem muita coisa parecida, mas chega num patamar que muda.
Manaus começou com as Mina. O que aconteceu? As velhas mineiras vieram pra cá, abriram terreiro. O primeiro terreiro aberto aqui foi o do Morro, depois do Seringal. Mas por egoísmo, eu digo, a Mina se perdeu, porque elas foram morrendo e não foram passando. Chega um lá de não sei onde: “Ah!, eu sou isso.” O povo não tava acostumado, só tava acostumado com caboco. E os encantados daqui não tem patente como nós temos na Mina. No dia que você vier à minha casa, o senhor vai me ver cantar o Jêjo, cantar o Nagô, eu posso está em cima de seu Miguel, mas tem todo um ritual pra vodun, todo um ritual pra orixá, todo um ritual pra encantado, cada um diferente. E os filhos da minha casa já sabem como é. Se um dia forem pra qualquer lugar: “Olha, eu sou isso, sou isso e isso.” O senhor já deve pegado algum pai de santo: “Eu não sei isso, tenho primeiro que consultar meu vodun, meu caboco.” Não. É aquilo que eu lhe disse: “Tem coisa que eu posso lhe dizer. Olhe, daqui pra frente eu não posso mais lhe falar.”
Aqui não existia Pombagira. Quem trouxe Pombagira foi seu Osvaldinho e dona Léa, do Rio de Janeiro, dos cariduzocas. Hoje em dia todo mundo tem Pombagira. A essência veio com eles. Quem expandiu Tambor de Mina aqui? Mãe Nina. Quem expandiu Tambor-de-Mina aqui? Foi erro. Você pode ver que eu vou em qualquer lugar. Em qualquer lugar eu faço festa. Na Umbanda tem muitos encantados que vem de Mina. O que aconteceu? É assim: a senhora chegou no Maranharo, o que você gosta de comer? No Maranharo não tem jaraqui não, tem melro. O que a senhora vai fazer: “Vou comer esse aqui.” Se acostuma. Assim é os encantados. Vieram, chegaram aqui, não tinha Tambor-de-Mina, só tinha Umbanda. Eu sou assim. Me convidam pra festa do Pombagira, eu vou, não danço, mas sou amigo de todas e de todos. A pessoa me convida: “Seu Baianinho, vamo ali escutar a missa.” Eu vou, só não fico a missa inteira. No Marnharo isso é normal: nós sair em cima dos filhos, tomar uma espumosinha com os filhos, amigos. Aqui, quando seu Miguel chegou aqui há vinte anos atrás, diziam que eu era doido, que era o capeta. Aqui eu não ando mais.
Dentro da Casa de Iemanjá, no dia de São Jorge, tem uma festa muito bonita. O pai de santo de seu Miguel, seu Jorge, foi presidente da Federação durante muitos anos. Todo mundo sabe que todo umbandista gosta de São Jorge, e, queira ou não queira, Umbanda é a coisa que mais cresce em todo o Brasil. Então ele começou a fazer essa festa, o meu pai, João Guerreiro de Alexandria, turco, entregou essa festa pra ele comandar. Depois que ele saiu da presidência, sempre teve essa festa muito grande. Então, tem a missa de manharo, depois vem da missa em procissão, chega no terreiro, toca o tambor, de manhã cedo, 8h, toca até umas 11h, aí vem o armoço, aí tem outra procissão, a gente acompanha a procissão, quando chega, todo mundo lava seus cavalos, aí já começa o tambor de noite, pra Ogum. Nós estamos lá sentados numa roda, acabou o tambor umas 11h da noite, lá vem o padre da Igreja da Conceição e umas cinco beatas. Entrou no tereiro, recebemos direito, o andor tava lá todo arrumadinho, e ele foi lá pra conhecer São Jorge, que ele não conhecia. Isso tem. Aqui só tem uma festa que fazem junto, que é São Benedito, mas mesmo assim…
Na Mina não tem esse negócio de linha não, esse negócio de bem e de mal. Em todo sabadoro a gente tá aqui pra atender os que precisam. Não tem coro, não tem qualidade, não tem bandeirinha. O senhor pode ter milhões, a senhora pode ter milhões, essa aqui é pobrezinha, eu atendo ela do jeito que atendo todos vocês. Chegou aqui, tá precisando: “Pega as velas, se não tiver vela grande, sete dias, acende uma pequenininha”, mas eu não deixo sair da minha casa sem uma resposta, sem nem pelo menos o peito pra cima. Não sei se isso é uma dádiva da Mina, pois quase todo mineiro tem esse coração… O senhor quer amarrar quem? Não tem amarração, isso não existe. É tipo: “Fulano matou fulano com feitiço.” Ninguém mata ninguém com feitiço, quem mata é Deus. Se alguém faz feitiço pra senhora, feitiço espiritual — o feitiço é espiritual —, se a senhora vai ter que morrer, a senhora morre, mas senão aparece alguém que bate na sua porta: “A senhora tá com problema, vamos fazer um banho de sal grosso”, e a senhora fica boazinha. Por que? O espiritual ali se transforma em material, porque ninguém morre de feitiço, aquilo é jogado, aquela energia negativa é jogada, e se transforma numa coisa material, e aquilo lhe leva. Ninguém tem poder de matar ninguém, tem maldade no mundo. Assim como tem a caridade, tem a maldade.

Do jeito que o mundo anda, tão atravancado, cheio de doenças, cheio de um monte de pais fazendo esganeira com as filhas, um monte de gente passando fome, que às vezes não tem nenhum grão de arroz pra pelo menos socar no pilão e fazer uma água pra poder tomar, que as religiões, em vez de se apedrejarem, se unissem, já que todas se dizem levar ao mesmo Deus, se unissem num propósito de engrandecimento não só de uma nação, mas de um mundo todo. É tão bonito o senhor chegar na minha casa, eu posso não ter ouro pra lhe cobrir, mas tem pelo menos mingau de farinha branca com sal pra eu lhe dar pro senhor tomar. É bonito o senhor chegar na porta da minha casa com problema, eu não sou Deus pra resolver todos os seus problemas, mas sou encantado, e quando o senhor sair da minha casa o senhor vai sair leve e puro, confiante e guerreiro para destruir qualquer coisa que vier pela frente. Então, seria muito bom isso, o senhor vir na minha casa, uma casa de nação afro, caminhos afro, uma casa de espiritualidade, eu lhe dar um conforto, o senhor chegar numa igreja evangélica e lhe darem um conforto, o senhor chegar numa igreja católica e lhe darem um conforto, o senhor chegar num Hary Chrystmas e lhe darem conforto, chegar numa carismática e lhe darem conforto, mas tudo com um denominador comum: o grande, o arquiteto do mundo. Isso não vai acontecer se o senhor chegar na minha casa e disser lá só existe demônio, porque dentro da religião africana não existe demônio. Demônio é aquela coisa negativa que cada um tem dentro do peito, dentro do coração, aquela maldade que você deseja ao seu próximo, aquilo é demoníaco.

Gostei muito do assunto que se refere ao Tambor de Mina, e a reportagem do Baianinho do Tambor de Mina, quero saber mais sobre os encantados, trabalho com alguns deles, me enviem por favor algo sobre eles no meu e-mail agarthes@hotmail.com, abraços
GOSTARIA DE SABER SOBRE TAMBOR DE MINA.GOSTARIA DE SABER DA CHICA BAIANA SE ELA VEM DA ENCANTARIA.PEÇO POR FAVOR P/A ENVIAR NO MEU EMAIL THECAVALCANTES@YAHOO.COM.BR ABRAÇOS A TODOS
esta materia esta de parabens,
encheu nossas mentes de um assunto rico e filosofico do ponto de
vista cultural e religioso .Sucesso pai Miguel !
Seu Baianinho, grande encantado e amigo conselheiro! Olha oque esse homem me disse mudou minha vida, pra melhor e claro que manifestado na cabeça de Pai Miguel, quando o referido pai de santo esteve de passagem por Macapá-Ap. Tive a honra de conhecer Pai Miguel e seu encantado Baianinho, jamais esquecerei esse momento,foi mágico…falou sobre meus problemas e aflições como se me conhecesse de muitos anos, e me ensinou a saida. Sou extremamente grato a esse encantado e a seu filho, esperando que um dia desses venha nos visitar, como prometeu na cabeça de Pai Miguel…SALVE SEU BAIANINHO E HURRAS A PAI MIGUEL!!! SAUDADE DE AMBOS…
Sarava meu pai baixinho cristino de oxala teresina. Piaui