SENTIDOS DO CARNAVAL
O sentido tem sido um tema de ampla preocupação àqueles que estudam as estruturas ou não estruturas do que é tomado como realidade, as convergências das opiniões significadoras, o eidos (idéia) confiável do existir. Filósofos, filólogos, sociólogos, teólogos, estetas, críticos de tendências variadas debruçaram-se sobre este tema, e, como não poderiam se eximir, também os chamado sensos comuns. Assim é que em tempo de carnaval é comum ouvir de um o imperativo categórico carnavalesco que o verdadeiro carnaval é aquele em que as marchinhas estão presentes. Ou seja, o sentido do carnaval quem estabelece são as marchinhas, fora delas não há alegria para os foliões. O que é tido como um despropósito para os outros que também pleiteiam outros sentidos para seus carnavais, como os baianos “festivos” e os manauaras boisófilos (excluindo o real ruminante). Só que estes sensos não percebem que estes sentidos que defendem como real escapam dos dois sentidos que pré-ambularam a festa do corpo-alegre. Um, a festa dionisíaca do Canto do Bode do período da colheita da vinha na Grécia agro-pastoril, o vigor possível da festividade ocidental, onde crianças, adultos e anciãos se mascaravam em gestuais diferente das posturas cotidianas fazendo do corpo a perversão antagônica dos movimentos corporais dirigidos aos fins comuns. A potência trágica como alegria do instante-lúdico criando a pantomima do novo, livre de qualquer memória corporal resultante de códigos morais impostos socialmente, mas corpo com outro sentido, o sentido trágico da vontade da vida, percursos da filosofia e do teatro, a poiesis. Dois, producere do profano: pôr na superfície a alegoria que está oculta no interior do templo: os interesses alienantes da festividade. Assim, alheios a este sentido, os três sentidos caem no logro do rastro lingüístico-político da dogmática cristã medieval com seu ponto de demarcação carne levare: afastar a carne ou carne vai = Carnaval. Perder o desejo para entrar na quaresma. Na ordem do desejo não há salvação. Angústia do esvaziamento do desejo, despotencialização da vida. E no logro econômico, político e social das forças dominantes que impuseram aos pseudos sátiros, as marchinhas, corpos urbanos classe média paulista e carioca pesadamente dolentes, os conteúdos preconceituosos, discriminadores e classificadores encontrados no “O teu cabelo não nega, mulata…/ Mas como a cor não pega, mulata/ Mulata eu quero teu amor” (Discriminação racial), “Olha a cabeleira do Zezé/ Será que ele é?” (Homofobia), “Hoje tenho uma lambreta para ver o meu amor” (Marketing do consumo), “É dos carecas que elas gostam mais” (Hominismo). Aos baianos, os loteamentos das ruas, vielas, praças, orlas, pelo capital empresarial com ranço ACMalvadeza embrulhados para presente foliesco pelos balconistas Caetano, Gil, Sangalo, Carlinhos, Netinho, Betinho, Claudinha, Mercury, etcs e etcs. E aos manauaras, o carna-boi, literalmente carne de boi, a antecipação das festas juninas. Nos três sentidos, tudo o que não é sentido para o povo, cuja festa o corpo criativo escapa dos movimentos formas-dirigidas, e o espírito livre escapa da semiótica despótica.
carnaval!
CARNAVAL E CHATO