! Fim de tarde, fim de serviço, espera da condução. Um cano gelado no pescoço, uma imposição e a entrega do celular. Ficou lívida e gelada. O cara ainda olhou para trás e jogou um beijo. O beijo aéreo diminuiu seu temor, mas não diminuiu a dor da perda do objeto comprado no dia anterior. No dia seguinte foi o comentário na empresa. Coitada pra cá, coitada pra lá, esta cidade está inabitável, ninguém faz nada… Mas em sua contabilidade, a vida continuava. O que mais amava ainda possuía: a vida. Foi um grande susto, mas tudo bem, estava com vida. Dos males, o menor. A sua vida não tinha preço que a pagasse. Sempre falava para si que nada no mundo se comparava com sua vida. O seu único amor. Antes de sair para o almoço o chefe se aproximou e lhe deu um presente: um celular. Último modelo, com todos os recursos teletecnológicos da pós-modernidade. Tímida, não quis aceitar, mas com a insistência do chefe, aceitou. Agradeceu e saiu lembrando dos comentários da amigas sobre os olhares do chefe para ela. Olhares que em alguma vezes percebeu de esguelha. Fim da tarde, fim de serviço, espera da condução. Gritos atrás de si, ela se virou e viu um rapaz com um revólver passar correndo por ela, a turba correndo atrás dele, distante ele parou e atirou em direção à turba. A bala furou sua farda em cima de seu peito na área do coração. A turba atônita gritou que ela fora atingida e ia morrer. Ela sentiu o cheiro da bala, passou a mão sobre o tecido, sentiu uma vertigem, lembrou de seu tesouro, sua vida e esperou o último suspiro. Esperou, esperou, esperou: não veio. Continuava respirando livre e solta. Lembrou que a farda tinha um bolso e no bolso colocara o celular. O celular lhe salvara. No outro dia chegou na empresa charmosíssima em uma saiinha de atentar o Clodovil. Barriginha de fora, expulsa por uma leve mine blusa. Esperou o chefe chegar. 10h ela entrou em sua sala, ficou em sua frente, levantou a malvada saiinha, o chefe gaguejou, ela mandou-o calar, se aproximou, abriu sua braguilha e sentou em seu colo. Era tudo que o chefe sonhara. No galope patronal, ela lembrou que não sentia nenhuma atração por ele. Visualizou o celular furado pela bala celular e sorriu afirmando para si que uma simples transa não era mais importante que sua vida.

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