“TEMOS QUE ESCOLHER QUEM DEVE VIVER E QUEM DEVE MORRER”, DIZ MÉDICA DE MANAUS. E BRECHT PERGUNTARIA: E POR ONDE ANDA DEUS?

0
Corona Virus

Corona Viruses against Dark Background

PRODUÇÃO AFINSOPHIA.ORG

 

Deus põe e dispõe! Proclama a enunciação-teológica do livro tratado da formação politica do Estado Hebreu, a Bíblia, segundo o filósofo Spinoza. Deus é o criador da criatura homem. Na concepção mistificada, Deus tudo pode. E tudo pode sobre o homem. Seu poder se espalha como intemporalidade: é o antes, o agora e o depois. Nada lhe escapa.

Mas, Deus, em um ato-zombeteiro, concedeu a razão ao homem para que ele fosse responsável por suas escolhas, por suas causas e consequências. Como afirma o não-Deus, filósofo Sartre. Com essa qualidade, o homem pôde, como um quase-Deus, criar cultura, civilização. Um mundo de sua responsabilidade para que não possa atribuir a outro o que é de sua ordem. E nesse caldo cultural-civilizatório, se manifestaram as enunciações, políticas, científicas, jurídicas, antropológicas, morais, etc.

Entretanto, o ato-zombeteiro de Deus, não impediu que o homem cultuasse a mistificação. Quando seu narcisismo falha é ela quem surge como racionalizadora diante do impasse. Todavia, nem sempre a racionalização-mística surte o efeito procurado. Então, a impotência se mostra como uma angústia que leva o homem propender a ser Deus.

Como se sabe, principalmente no Brasil, os mais de 200 mil mortos pela pandemia, são diretamente produtos da incapacidade-política, intelectual e moral do desgoverno Bolsonaro. Um homem que se diz, pela mistificação, um temente ao Senhor-Deus. Um homem que não adotou as medidas necessárias ao combate da pandemia e evitar o dessacralizado número de mortos. 

Diante desse quadro de terror, promovido pela ineficiência política, responsável pela negação científica de uma metodologia combatente da pandemia, os profissionais da saúde, envolvidos na luta contra a pandemia, recorrem ao atributo de Deus: escolher a vida ou a morte de seus irmãos e irmãs. 

O imperativo categórico-deificante, “Temos que escolher quem deve viver e quem deve morrer”, proclamado pela médica de Manaus, sintetiza a discursividade da onipotência-teológica encadeada com a impotência-humana provocada pela posição antidemocrática de um desgoverno que só faz difundir, debochadamente, a dor dos enfermos e dos parentes dos mortos.

A pandemia é coisa do homem-capitalístico. Assim, como escolher a vida e a morte de um enfermo pandêmico, é também coisa do homem-capitalístico. Não adianta querer mistificar. Deus, existindo ou não, não tem qualquer responsabilidade sobre ela. Coisa do homem é coisa do homem, como o dramaturgo Brecht concebeu em seu poema-teo-revolucionário, Hino A Deus. E quando ele pergunta: E por onda anda Deus?, ele sabe. Deus anda lutando contra a opressão que joga os trabalhadores, a classe pobre, humilhada, “no fundo dos vales escuros”. Sua luta é contra os que querem se passar por Ele provocando somente a dor. Diz, Brecht: 

1

“No fundo dos vales escuros morrem os famintos.

Mas você lhes mostra o pão e os deixa morrer.

Mas você reina eterno e invisível

Radiante e cruel, sobre o plano infinito.  

Deixou os jovens morrerem, e os que fruíam a vida

Mas os que desejavam morrer, não permitiu…

Muitos daqueles que agora apodreceram

Acreditavam em você, e morreram confiantes.

3

Deixou os pobres pobres, ano após ano

Porque o desejo deles era mais belo que o seu céu

Infelizmente morreram ante que chegasse com a luz

Morreram bem-aventurados, no entanto – e apodreceram imediatamente.

4

Muitos dizem que você não existe e que é melhor assim.

Mas como pode não existir o que pode assim enganar?

Se tantos vivem de você, e de outro modo não poderiam

                           morrer –

Diga-me, que importância pode ter então que você não exista?”

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.