A “NÃO CASSAÇÃO DE AMZONINO” — UMA TESE IMPROVÁVEL
A política é estabelecida na forma de cidade. Esta é produzida a partir das várias atividades, materiais e imateriais, que seus moradores efetuam transformando as suas dimensões espaços-temporais. Deste modo a cidade passa a ser organizada em diferentes segmentos responsáveis por preservar a existência de sua estrutura física, econômica, social e afetiva. Através das ações e falas dos que vivem na cidade é criado o espaço público onde todos podem fazer valer ativamente suas opiniões a fim de fazer com que esta estrutura produzida seja desenvolvida de forma a efetivar o bem comum como principal objetivo para todos. Portanto, a cidade é uma movimentação ético-política-estética. Negar a cidade como esta potência é se negar a expor a sua fala e ação de modo ativo e participar diretamente de sua produção e se mostrar como uma “doença da cidade”.
Em Manaus, após a decisão da juíza Maria Eunice de cassar o prefeito eleito, Amazonino Mendes (PTB) e o seu vice, Carlos Souza (PP), desta movimentação pode ser extraído um sentido que se desdobra em dois outros sobre alguns fatos que surgem e fazem gerar algumas sensações.
Pessoas que se dizem não sabedoras da cassação de Amazonino e seu vice, mas que quando ficam sabendo não perdem tempo em expor a proposição de que eles (leia-se Amazonino, quase nada falam sobre seu vice), não serão cassados. Insistem que por mais que possa ser verdade o que estão dizendo deles não haverá uma condenação e eles se livrarão das acusações. Além de sustentarem suas vozes passivas em meio aos acontecimentos, agem defendendo uma tese improvável por dois motivos.
MOTIVO I: LÓGICO-JURÍDICO
Uma proposição que diga que a cassação de Amazonino Mendes, junto com o seu vice, não será confirmada constitui-se como a defesa de uma tese improvável, porque seria colocar em suspeição o sentido e entendimento lógico-jurídico do fato embasado nos códigos legais assegurados por uma constituição. Códigos esses que só foram possíveis graças a um regime democrático representativo constituído onde se encontram os representantes da cidade que projetam e aprovam leis, portanto, produção daqueles que vivem na cidade. Ainda que caiba recurso, este não se constitui como uma provável absolvição, assim como a cassação ainda não é definitiva, contudo, o que foi determinado, provisoriamente, pela juíza Maria Eunice, carrega consigo a força da lei que é construída a partir de preceitos lógicos que asseguram a decisão. Portanto, neste sentido, deriva-se desta suspeição como conseqüência o absurdo. Pois colocar em dúvida a decisão judicial de maneira alheatória é colocar a própria justiça em suspeição. Ainda aí caberia o argumento de que a justiça pode ser colocada em dúvida, sim. Fato este que não faz com que a decisão seja apagada da realidade. Cabem, sim, contra-argumentos que sejam tão bem fundamentados racional e logicamente quanto foi os que possibilitaram a cassação.
MOTIVO II: ÉTICO
O sentido do absurdo não é somente pôr em suspensão o sentido lógico-jurídico do fato. Ele é também ético por contrariar o sentimento das pessoas honestas. E honestas não somente no sentido de caráter reto, mas de pessoas que se colocam na existência de modo autêntico como responsáveis por preservar uma vida sem privações para todos e não deixar se desenvolver as condições de miserabilidade que conservam o povo sob exploração. Esta condição de miserabilidade toma força quando as pessoas não impulsionam as suas vozes e ações de modo ativo na cidade. Ao invés de produzirem suas opiniões a partir do que vem de fora de si (ou seja: fora da cidade), procurando endossar as discussões que produzem problemas, procurando as suas respostas, vivificando assim o exercício da produção da cidadania, elas preferem se esquivar ao longe deste exercício. Assim, apenas pensam com a barriga e refletem a partir de si próprios (e não da cidade). E sentem na pele aos ossos as dores dos corruptos como se fossem suas. Estas pessoas, constituem a “doença da cidade”, posto que se calam quando falam. Enquanto isso, até os advogados de Amazonino já dão bandeira…