A HOMOGENIA PAULINA DE BENTO XVI

A Igreja Católica Apostólica Romana tem muito mais de Paulo de Tarso do que de Cristo. Aquilo que Jesus, o Palestino, trouxe como mensagem de alegria, uma mensagem política, de libertação das paixões e de atuação comunitária, foi transformado por Paulo – não ele, individualmente, mas auxiliado pela subjetividade da época – em uma igreja cultuadora da dor, da imobilidade, do ressentimento, da inveja, da mentira, da ilusão.

O grande jejuador, aquele que despreza o próprio corpo e o transforma no santuário da privação, independente da igreja ou denominação religiosa que professe, é um decadente. Humano, demasiado humano, portador de uma enfermidade: a daqueles que renegam sua própria natureza – natureza aqui não como essência, mas como condição estética-materialista de existir – e cultuam a autoflagelação. Direcionam o ódio nascido de uma existência passiva contra si mesmos, e são adoradores do sofrimento e da dor. Daí Paulo inserir na sua igreja figuras como o Cristo eternamente crucificado, a Dívida Eterna, impagável pelos mortais que ousaram matar o avatar do Divino, o Pecador, que só resgatará a dívida eterna após a morte, e o próprio Pecado, deterioração de atos humanos sob a ótica corrompida do dever através de uma causa externa. É o comercio entre seres imaginários, segundo o filosofante Nietzsche, que amou Rilke e Lou-Salomé.

Este é o tipo que compõe a igreja católica – e, por tabela, as disangélicas apocalípticas – e que, através de seu sacerdote-mor, Ratzinger, instituiu a figura do psicólogo nos seminários, a fim de identificar e segregar candidatos com perfil homoerótico. Segundo o documento, elaborado pelo próprio Ratzinger a partir de uma ordem do então Papa João Paulo II, os psicólogos deverão identificar traços de “dependência afetiva forte, identidade sexual incerta e tendência arraigada à homossexualidade”. A justificativa é evitar os casos de pedofilia e pederastia que constituem epidemia mundial entre os padres.

Há que se fazer duas observações sobre o caso:

Primeiro, o motivo da segregação – que em alguns países, incluindo o Brasil, é ilegal – não se reduz à discriminação, saída do culto ao esvaziamento da potência política-sexual do corpo, mas envolve interesses econômicos também. Assim o foi com o celibato clerical: a vedação ao casamento e procriação, foi instituída primeiramente no Concílio de Elvira, em 307 d.C., e posteriormente confirmada e transformada em regra no Concílio de Latrão, em 1123. No entanto, ela não é um dogma e nem consta nas leis do Direito Canônico. O motivo principal, portanto, é econômico: os padres, e principalmente os papas, não podiam ter descendência, sob o risco de, pelas leis de linhagem e herança, requererem legalmente as riquezas católicas que eram administradas por seus pais. Da mesma maneira hoje, milhões de dólares, principalmente nos EUA, são gastos com processos jurídicos contra padres, bispos e outras autoridades eclesiásticas acusadas de pedofilia e pederastia. Homos e héteros.

Segundo, o papel da Psicologia e dos psicólogos como portadores do saber necessários à política segregacionista do Vaticano. Não é, também, de hoje que a Psicologia se presta a estudos e práticas nocivas aos Direitos Humanos. A pretensa ciência que se encarrega de estudar o comportamento, motivações e paixões humanas, na sua vertente Organizacional, ou Empresarial, nasceu a partir de estudos neuropsiquiátricos dos exércitos beligerantes, sobretudo na Segunda Guerra Mundial. Segundo aponta o psicólogo existencialista Erich Fromm, a psicologia de estudo dos padrões, e que atualmente é usada em processos de seleção para emprego em indústrias e no comércio, foi originalmente usada em benefício da guerra. Os avanços na psiquiatria forense e na psicologia das habilidades se davam a partir do momento em que o exército demandava pessoas com características individuais precisas para determinada atividade (por exemplo, um caráter detalhista, quase obsessivo, trabalha bem em atividades que exigem grande concentração, como na indústria balística). Para atirar à queima-roupa em um inimigo, é preciso que o soldado tenha algum grau de desvio do senso de solidariedade e de empatia com o outro. Cabe ao psicólogo descobrir os melhores “matadores”. Atualmente, a figura do psicólogo é essencial às forças armadas, desde a seleção dos candidatos até o desenvolvimento de novas armas (como por exemplo, a bomba-gay).

Assim, a questão é de homogenia: a produção de “humanos-padrão”, com os mesmos hábitos, os mesmos gostos, e o mesmo amor à Deus. O homoerotismo faz parte do Cristianismo desde os tempos de Jesus, que escolheu 12 homens para segui-lo, embora amasse mesmo Maria Madalena, com quem, segundo evidências ocultadas pelo Vaticano, casou e teve filhos. No século das Luzes, o filósofo e enciclopedista Denis Diderot usou o humor para evidenciar o moralismo teocrático, em sua obra “A Religiosa”, que mostra o homoerotismo e os abusos sexuais nos conventos europeus. Assim, a igreja apenas coloca em prática mais uma tentativa natimorta de expurgar o estranho. No caso da doutrina da decadência, o ideal ascético, o estranho é o si-mesmo como espectro. O estranho “prazer” de renegar aquilo que Deus, auspiciosamente colocou logo abaixo da cintura, à frente e atrás, para deleite e prazer dos seres humanos na Terra.

Ui! E agora vamos ver outros sopros gayzísticos (ou não) que passaram no nosso Mundico!

Φ SE O MUNDO É GAY, O FUTEBOL TAMBÉM É. A FA (Football Association), da Inglaterra, promoveu na semana passada o fórum “Homofobia: o fim do tabu no futebol”. Lá, o ex-jogador John Elliot disse ter conhecido pelo menos 12 jogadores homoeróticos nos clubes por onde passou. Elliot jogou no Chelsea, Aston Villa e Celtic (Escócia). Segundo ele, o maior impedimento para que os jogadores assumam a sua orientação sexual é o medo da reação dos fãs. Na mesma linha de combate, o grupo “Kick Out!” pretende lançar um programa de palestras de jogadores em escolas e outros ambientes públicos, sobre a incompatibilidade entre homofobia e futebol. Haverá também, por parte da comissão de direitos humanos, a iniciativa de produzir um vídeo com mensagens contra a homofobia, gravadas por jogadores heteros, e divulgado na MTV, em escolas, e antes das partidas do campeonato inglês. Excelente iniciativa, afinal é o amor, e não o ódio, que leva 22 homens a brincarem juntos tendo uma bola como justificativa. E não nos venham com essa de que futebol é coisa para macho! Nem se fosse pela biologia, seria, afinal, as fêmeas se dão bem no quadrado riscado em giz dos gramados. Não por acaso, a Frangisleyne foi convidada para ser beque-central de um time do torneio do campo do Roma, lá no Novo Aleixo, zona Leste de Manaus. Sentiu a brisa, Neném?

Φ SISTEMA PRISIONAL PERNAMBUCANO DISCUTE HOMOFOBIA. Começou a funcionar na semana passada, em Pernambuco, o projeto “Unidades Prisionais Sem Homofobia”. A iniciativa saiu de um estudo feito pela ONG “Movimento Gay Leões do Norte”, que detectou a situação vexatória dos prisioneiros LGBT em presídios do Estado. O projeto consiste em palestras e encontros com os detentos, a iniciar-se pelos de orientação sexual definida, e nesses encontros, se discutirão questões de saúde e cidadania, além de informações sobre como se define a orientação sexual. O movimento ainda organizou o Centro de Referência Contra a Homofobia, que reunirá advogado, assistente social e psicólogo, e atuará na defesa dos direitos LGBT. Excelente iniciativa, de um movimento que realmente movimenta intensivamente e democraticamente o Estado de Pernambuco. Pena que esta energia, esta potência de agir não contamine outros movimentos Brasil afora. Teríamos certamente um impacto na violência social homofóbica que é reinante neste país. Sentiu a brisa, Neném?

Φ SÃO JOSÉ DO RIO PRETO TEM AMBULATÓRIO “T”. A cidade do interior paulista acaba de inaugurar o ambulatório de saúde T, localizado na UBS do Jardim Vetorazzo, especializado no atendimento de travestis e transsexuais. O diferencial fica por conta do treinamento dos funcionários que atuarão no ambulatório, e no tratamento especial, que começa pelo uso do nome social. A iniciativa é da ARTTS (Associação Rio Pretense de Travestis e Transsexuais), Secretaria Municipal de Saúde e o Centro de Referência no Combate à Homofobia. O objetivo principal é atrair o segmento para os programas de saúde oferecidos pelo SUS, já que o ambulatório tradicional costuma afastar este público. E não se trata de segregação ou mesmo de beneficiamento de um segmento: aqui vale o mesmo entendimento da Lei Maria da Penha, o de que, na prática, o Estado deve promover ações de diferenciação para garantir a igualdade civil. Sentiu a brisa, Neném?

Φ GOVERNO DO RIO GARANTE PENSÃO A EX-COMPANHEIRO. A Polícia Militar do Rio de Janeiro negou; mas o governador Sérgio Cabral, como chefe maior da polícia, desnegou e concedeu ao companheiro do soldado Franklin Pereira Duarte, morto em serviço há 11 anos, pensão previdenciária. Cabral usou a lei estadual 5034/07, que garante o benefício a casais do mesmo sexo. O casal vivia junto desde 1989, e comprovou através de documentação e testemunhas. Um avanço que mostra que o governo carioca não é aliado somente em época de eleição, e que garante na prática a execução de leis que auxiliem na consolidação da cidadania LGBT. Nesse quesito em especial, o governo do Rio tem sido atuante. Ai, bate 10 Sergito! Sentiu a brisa, Neném?

Φ BEIJAÇO GAY CONTRA A HOMOFOBIA NA USP. Alunos do curso de Letras, Jarbas Lima e José Eduardo foram expulsos e constrangidos de uma festa do centro acadêmico de veterinária da USP, na semana passada. O ato foi registrado como homofobia na polícia, e foi programado um beijaço gay na frente do centro acadêmico, como forma de protestar. O CA de Veterinária contra-argumentou que o ato ocorreu por conta de “excessos”, e não pelo beijo em si. Afirmaram também que existem gays no centro acadêmico (justificativa na ponta da língua de dez entre dez homofóbicos: “eu não sou homofóbico, tenho até amigos gays” – falaremos sobre isso em breve). O certo é que um beijo incomoda a quem já é incomodado pela própria insegurança sexual, e desmonta o argumento de que homofobia e classe social são inversamente proporcionais. Alguém se habilita a ir a este protesto e protestar com a Janderlayne? Sentiu a brisa, Neném?

Φ GLOBO ABUSA DE CLICHÊS HOMOFÁLICOS. Enquanto alguns capturados pelo romantismo sequelado, o mesmo de Lindemberg, esperam a redenção moral pela transfiguração do beijo no hiper-real da telinha plim-plim da homofóbica Globo, a emissora-castradora continua utilizando o homoerotismo no seu aspecto mais pobre para lucrar: o clichê, signo-icônico que fortalece no receptor os enunciados que ele já possui, sem provocar alterações. Ou em outras palavras: fortalece a homofobia. Em uma cena de novela, uma personagem homoerótica, ao ver o amigo dar de presente a um recém-nascido um uniforme do Corinthians, afirmar que a criança será São-Paulina. Clichê vindo do homofóbico futebol brasileiro, fortalecido pelo inseguro-sexual Vampeta, que apelidou os tricolores de “bambis”. Torcedores do time do Morumbi protestaram, telefonando à emissora. Não se sabe de reações de grupos homoeróticos à comparação com torcedores do clube. Nos dois casos, caberia processo, já que o objetivo de uma concessão pública de canal de televisão deve servi a interesses democráticos, e não de disseminação de homofobia e de censura à inteligência. No entanto, além do processo jurídico que cabe neste caso, o processo mais eloquente e determinante pode ser dado individualmente, por cada inteligênciaque ainda não o fez: condenar em primeira e única instância a sequelada Globomofóbica, desligando a tevê. Cruuuzes, Jakelayne, se nenhum programa presta, então desliga essa desgraça! Sentiu a brisa, Neném?

Φ OUTRO MILITAR SOFRE DISCRIMINAÇÃO NA CORPORAÇÃO. Em 2004, o tenente Ícaro Ceita assumiu sua homoeroticidade dentro da corporação da PM baiana. A partir daí, passou a sofrer todo tipo de discriminação, tendo desenvolvido sintomas de depressão, ao mesmo tempo em que sofria processo por suposta deserção. Em entrevista ao jornal Correio da Bahia, o militar relatou sofrer retaliações, e ter sido chamado de “a vergonha da corporação” em público. Esta semana, saiu o parecer do procurador Luiz Augusto de Santana, do Ministério Público da Bahia, que afirma, dentre outras coisas, que a homossexualidade é incompatível com a carreira militar. A revista “A Capa” trouxe alguns trechos do depoimento, que trazemos, a título de humor involuntário do promotor, para os leitores intempestivos. Os grifos são nossos: 1) “…É que no militarismo todas as atividades são coletivas, ou seja, dormimos juntos em alojamentos comemos em ranchos coletivos, tomamos banhos de forma coletiva, usamos os mesmo vaso sanitário …. e por isso não sei quais reações teria um homossexual no meio de pessoas do mesmo sexo despidos, mas certamente não reagiria como os heteros, por que eu por exemplo, afloraria minha libido. Em curtas palavras, ficaria excitado na presença de uma mulher despedia, ou a mulher na presença de um homem, coisa natural a qual quer ser normal”; 2) “Contudo, como cientificamente já provaram que a mente do homossexual funciona igualzinho a mente do hetero do sexo oposto, a coisa ficaria complicada, e possíveis reações de assédio poderiam desaguar em instabilidade disciplinar, com prejuízos sérios para a própria corporação...”; 3) “Um homossexual jamais pode ser apontado como pessoa discreta em suas atitudes e maneiras, e que pode servir de exemplo a quem é alvo do seu preparo moral. Isso pode funcionar até em outra nação, mas ainda não no Brasil, embora tenhamos avançado muito nessa questão…”. Em determinado momento do parecer, o promotor cita a deontologia do militarismo, que versa sobre a “boa” prática, a que beira a perfeição. Pois bem, percebemos o quão distante estão os métodos, crenças e competência técnica do promoto, de um deontologia do Direito. No primeiro trecho, ele usa a si mesmo como exemplo, partindo do particular para o geral, quando o sentido do uso de uma lei é bem o contrário: julgar o particular pelo geral. Se o argumento do promotor fosse verdadeiro, não haveria um só lugar no mundo onde homens e mulheres pudessem estar juntos que não fosse no ato sexual. No segundo trecho, o pseudocientificismo do promotor vai de encontro às últimas descobertas das neurociências sobre o cérebro, além, é claro, do emprego da palavra “igualzinho”, bem coloquial para uma peça jurídica. No terceiro trecho, o promotor julga o Brasil inferior à outros países na questão dos direitos LGBT, que são mais “avançados”, embora acredite que “jamais” um homoerótico poderá se adaptar moralmente à sociedade. Mais paradoxal impossível. Vê-se bem que o poder judiciário da Bahia está muy bem representado, na competência, justeza e progressividade deste representante ora citado aqui. Ironias à parte, a peça jurídica dá abertura para um processo contra o Estado e contra o promotor, já que extrapola os limites do argumento cabível e recai no pseudocientificismo e no “achismo” do promotor, que age de acordo com seus próprios preceitos morais. Sentiu a brisa, Neném?

Beijucas, até a próxima, e lembrem-se, menin@s:

FAÇA O MUNDO GAY!

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