A grande dor dos ideólogos midiáticos à direita da imagem-Deus é que o objeto de seus desejos, sua meta, aqueles a quem o seu trabalho deveria alcançar, nos últimos anos, não tem respondido de forma condizente com os seus esforços.

Uma ilustração: o governo Lula, e o próprio presidente, inabalável em seus sucessivos recordes de popularidade, em meio ao tiroteio diário midiático, há pelo menos sete anos, nos principais meios de comunicação do país. Neste meio tempo, Lula sobreviveu a zil CPI’s, supostos escândalos e tramóias, sendo eleito e reeleito, e com a gigantesca possibilidade de fazer o seu sucessor, graças, ironicamente, à mídia que lhe é hostil.

A mídia oficial descartou a lógica do fato e adotou a da imagem: o teleacontecimento como verdade, a despeito do real acontecimento. Ignora-se que contar um fato é reinventá-lo, ou na melhor das hipóteses, sabe-se disso, e utiliza-se disso. Não é o caso da mídia nativa, menos ainda da mídia local, de Manaus. A sobreposição entre o fato e sua imagem, feito de forma a desterritorializar referenciais de tempo e espaço, e territorializar uma moral de classe, rompe a relação de causalidade e de finalidade entre o ato e sua narração. Pior para a notícia. Necessita, como já abordamos aqui, de uma sobreposição de dizeres, a fim de suprir a anemia de realidade que não obstante, transborda. Daí, na briga entre a mídia e o governo Lula, ainda em nossa ilustração, quem realmente perdeu algo – se é que algum dia o teve para além da ilusão – foi a mídia, antes crente em si como Deus (onipresente, onipotente, onisciente).

Diante da avalanche de dizeres supérfluos, resta ao leitor a ironia: longe de estar indiferente, como pensam os ideólogos da direita, a massa não é inerte. Não obstante à sua passividade diante dos conteúdos produzidos pela mass media, ela continua consumindo o produto midiático: jornais, rádio, tevê, etc. Mas consome como num desafio: “que mais?”. Como se perguntassem constantemente, o que mais irão inventar? Diante da impotência concentual da direita e da esquerda em oferecerem alternativas efetivas para problemas cotidianos reais da sociedade capitalista, as massas apontam o caminho, sem niilismo, sem desespero. Ironiza estes que se autoproclamam os salvadores da terra.

Um rastro desta ironia se viu em Manaus, por exemplo, quando, diante da inoperância da gestão serafinesca, e da nulidade das opções oferecidas pela política partidária, a população elege justamente um dos responsáveis pela miséria social em que vive a Princesinha do Norte. Vítima de seu narcisismo patológico, Amazonino acreditou estar sendo eleito per si, quando na realidade era uma expressão do esgotamento conceitual da política amazonense: não há diferença, todos, à direita e à esquerda, são ou se apresentaram como iguais.

Daí a (indi)gestão inerte do atual prefeito e de seu vice, paralisia social, que se materializa nos postos e casinhas de saúde, sem remédios, nas vias públicas, com o trânsito intransitável e pelas obras descoordenadas e inúteis, pelos buracos que enfim encontraram, depois de boa gestão do prefeito anterior, na atualidade, um de seus criadores, mais de dez anos atrás, pela educação emparedada, pelo desrespeito ao funcionalismo público, e por aí segue.

A MÍDIA QUE CAIU NA IRONIA DO POVÃO

Na edição deste domingo do jornal A Crítica (Acrítica), na coluna Sobe e Desce – uma espécie de colunismo social “politizado” – aparece o prefeito sub judice, Amazonino Mendes, subindo, porque seu projeto sobre a meia-passagem estudantil teria sido “discutido e aprovado” pelos estudantes. Ao lado, a coluna do advogado Júlio Pedrosa, que trabalha para o jornal como advogado, fala sobre ética no jornalismo. Ironia do jornal para com seus leitores?

Não, na realidade, o jornal é a vítima da ironia. Primeiro, porque a ironia é um exercício intelectual elaborado, e não compõe com as sequelas que carrega a mídia domesticada aos interesses do capital. Segundo porque, ao abandonar o fato em favor da imagem, incorrendo no erro de confundir imagem e fato, o jornal aposta que seus leitores farão o mesmo, cometendo o logro cognitivo-epistemológico. O que não ocorre, já que a população sabe que o projeto do ex-governador e atual prefeito cassado não conta com o apoio da classe estudantil. O mesmo jornal, na sexta-feira, publicou que os estudantes continuariam os protestos em defesa do uso irrestrito da meia-passagem estudantil.

Daí o riso do leitor: ao acreditar-se superior em inteligência a ele, o jornal quer enredá-lo numa armadilha pueril. O leitor, ironicamente, sorri, sabe das tramas que envolvem a inclusão do textóide na coluna social jornalística, e responde com um silencioso sorriso: a confirmação da inutilidade do veículo que se vangloria de estar de mãos dadas com o povo. Qual povo, cara pálida?

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.