Com o crescimento demográfico do Rio de Janeiro e o aparecimento de transtornos no escoamento do trânsito na cidade nos fins da década de 60 e começo da década de 70, épocas brabas da ditadura militar, os governantes da ex-Cidade Maravilhosa resolveram alterar a rede urbana na orla litorânea, para ampliar suas avenidas. Assim aconteceu com os bairros da Glória e do Flamengo.

Esta desnaturalização engenheira foi chamada de aterro. Invadir as praias com asfalto. Uma técnica ilusória que parecia que o mar tinha sido afastado. E nesta ilusão chamava-se aterro da Glória, aterro do Flamengo. Era o urbanismo capitalista se impondo à natureza. Uma violência tecnológica tão urbana, que inspirou Gilberto Gil a adaptar Bob Marley para o carioquês com frases como: “A gente sentada ali / Na grama do aterro sob o céu / Ôôô observando hipócritas andando ao redor”. Um verdadeiro aterro. A sufocação da praia.

Então, eis que em pleno século XXI, na democracia lulista, quando a única ditadura que ainda permanece é a ditadura civil em alguns estados impostas por demagogos, no frio sulista de domingo, em plena Curitiba, o Mengão é aterrado pelo Coxa. Ou, para quem gosta de um bom conforto, o Mengão é coberto pelo Coxa distante da orla litorânea. 5.0. Na linguagem vulgar do futebol: 5X0. O Curitiba expandiu o placar e aterrou a praia do Flamengo. E nem precisou da ditadura.

Mas há como o Flamengo se ‘desterrar’. Criar um time em que os jogadores não entrem em campo como se tivessem carregando toneladas de areia. Para tanto, é preciso lembrar que se o Flamengo foi aterrado na ditadura e este aterro lhe causou um grande mal, hoje, qualquer ditadura que possa se mostrar no corpo do clube deve ser eliminada, porque sob ditadura ninguém é feliz. E 9 gols em 2 partidas é uma perfeita demonstração de infelicidade. Se o Mengão fizer assim, não mais ouvirá o conselho de Gilberto Gil: “Não, não chores mais / Menina não chore assim”.

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