!!!!! O MUNDO É GAY !!!!!
PRECONCEITO E SOCIEDADE DE CONSUMO
Deu o que falar a pesquisa realizada pela competentíssima Fundação Perseu Abramo em aliança com a alemã Rosa Luxemburg Stiftung.
Na chamada mídia sequelada, o destaque foi para apenas um dado da pesquisa, o mais inexpressivo, diga-se de passagem: “99% da população brasileira é homofóbica”. O que causou espanto em setores do movimento LGBT. Mas, se houve um entendimento de que o país inteiro (incluindo os próprios homoeróticos) são homofóbicos, então não deixe de acreditar na importância e no rigor metodológico da Perseu Abramo: simplesmente mude de canal.
Os caras não entenderam nada, baby! Leia um trecho do artigo de Gustavo Venturi, um dos responsáveis pela pesquisa:
“Indagados sobre a existência ou não de preconceito contra as pessoas LGBT no Brasil, quase a totalidade das pessoas entrevistadas respondeu afirmativamente: acreditam que existe preconceito contra travestis 93% (para 73% muito, para 16% um pouco), contra transexuais 91% (respectivamente 71% e 17%), contra gays 92% (70% e 18%), contra lésbicas 92% (69% e 20%) e, tão freqüente, mas um pouco menos intenso, 90% acham que no Brasil há preconceito contra bissexuais (para 64% muito, para 22% um pouco). Mas perguntados se são preconceituosos, apenas 29% admitiram ter preconceito contra travestis (e só 12% muito), 28% contra transexuais (11% muito), 27% contra lésbicas e bissexuais (10% muito para ambos) e 26% contra gays (9% muito)”.
Os grifos são nossos, e só não foram em azul-turquesa ou rosa-shoccking para não magoar suas pupilas, tá. Bem, trata-se de duas coisas bem diferentes, embora ambas nocivas: os brasileiros declaram haver preconceito, mas não se declaram preconceituosos. Ora, neném, se esta colunéeeesima fosse parada por um gatão na rua e questionada se existe preconceito contra os homossexuais no Brasil, ela diria que sim, ora pois! E se fosse perguntada se é preconceituosa, diria que sim, e aproveitaria para explicar o que é preconceito, apenas para dar uma cantada no entrevistador, mas isso é outra história! Claro que não somos preconceituosos. Nós nos gostamos indiscriminadamente!
Valores são produções humanas, e são derivados diretamente do tipo de sociedade que construímos para nós. Aquilo que é bom ou mal depende da perspectiva à qual se está adesivado. Numa sociedade onde a produção de bens de consumo é a mola-mestra, os valores irão carregar um estatuto de produtos: mercadorias.
Daí, um objeto travestido em mercadoria não tem um valor em si, mas seu valor depende do uso que a sociedade faz e de interesses entrelaçados. Não há um “alguém” que diz que aquilo é ou não é, mas há enunciados que atravessam as pessoas e fazem com que os signos se alinhem à ele. Assim, numa sociedade ávida por consumidores, já não importa tanto o que eles fazem com o corpo deles, se são homo, hetero, bis, mas sim se são consumidores. Isso elimina o preconceito? Óbvio que não. Ao contrário, os acirra.
Não havia nada mais doloroso para um comerciante burguês dos séculos XIV, XV, do que ter mais dinheiro do que os nobres e no entanto não ser aceito como um “igual” entre eles. Para tanto, a busca de elementos que carregassem valores reconhecidos pela nobreza e a avidez pela aceitação e pelo status social fez com que a classe burguesa passasse a produzir bens de consumo na tentativa desta aproximação. Claro, isto é infinitamente mais complexo do que o que apresentamos, mas nos interessa neste momento saber como os valores são produzidos.
Assim os valores eram adotados, independente do exame de seus elementos constitutivos. A igreja controlava o corpo e suas manifestações “satânicas”, e depois passou a bola para a ciência, mais notadamente a medicina, que dentre outras pérolas, condenava a masturbação e o homossexualismo até pouco tempo atrás.
Assim, a discriminação é antiga, e se continua a ocorrer, é porque nenhuma revolução cultural foi forte o suficiente para bani-la. Quem sabe a própria avidez do capitalismo, a cobra que engole o próprio rabo, consiga enfim unir a todos numa única categoria: a de consumidores. Que horrível, nêga!
Já a tolerância é mais recente. Tolerar não indica um progresso, mas com o enfraquecimento dos valores de discriminação direta, é preciso disfarçar. Daí a frase: “eu aceito homossexuais, mas na família do vizinho”. Tolerar é apenas uma outra roupagem da discriminação, tão perigosa quanto a discriminação aberta e assumida.
Por isso esta coluna entende a relevante pesquisa como um indicativo de que se deve repensar as práticas e estratégias de enfrentamento da discriminação contra os LGBT. Claro, é preciso propor leis, restringir a ação homofóbica, mas se não se atuar fortemente e junto com outros movimentos sociais para enfraquecer essa subjetividade que pretende “igualar” a todos como consumidores, a discriminação só vai mudar de roupagem. Os valores mudam, a violência permanece. Não por acaso, a pesquisa foi apresentada no Fórum Social Mundial de Belém. É que um outro mundo só será possível quando todos os povos desejarem a partir de si, e não da interdição e da homogenia.
Ui! E agora vamos ver outros sopros gays (ou não) que passaram no nosso Mundico! A Louca!
Φ ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS DE SP É REINCIDENTE NA HOMOFOBIA. Um funcionário público do estado de São Paulo entrou com um pedido de reconhecimento e inclusão do parceiro, com quem vive há oito anos, como seu dependente. Apesar de ter apresentado todos os documentos, recebeu uma negativa seca, sem justificativa que não o fato de serem dois homens a requerer o benefício. O funcionário, então, resolveu processar a AFPESP com base na lei estadual 10.948/01, que pune ações discriminatórias. Venceu! A entidade terá de reconhecer o casal e ainda sofrerá advertência. O casal recorreu para que a AFPESP pague multa, já que houve reincidência. Ano passado, outro casal teve o direito à dependência do parceiro negada. Na época, a AFPESP alegou que não se tratava de uma família e por isso não aceitariam uma união homoafetiva. Duplo preconceito, se a associação é dos funcionários públicos, deve abranger toda a sua rede social íntima, incluindo aí todas as vertentes familiares. Quanto à homofobia, se não vai pelo amor, vai pela dor. Institucional, no bolso, queridinha… Sentiu a brisa, Neném?
Φ PRIMEIRO CASAL HOMO DOS EUA SE DIVORCIAM. Hilary e Julie Goodridge foram as primeiras homoeróticas a oficializar a sua união nos EUA. Em 2004, foram pioneiras ao oficializar a sua união. Validíssimo, meu bem! Lin-do! E nem o recente divórcio anunciado em 2006 e concluído legalmente esta semana que passou elimina a importância do acontecimento. No entanto, é preciso aproveitar esta ocasião para comentar uma coisa que a gente insiste aqui, sempre: casar é direito, mas também pode ser uma armadilha. O desejo só nos pertence quando nasce de nós mesmos, quando nós somos sua causa. E isto só acontece quando, pela razão, compreendemos todos os elementos de ordem imaterial que capturam os nossos dizeres e quereres, enfraquecendo a subjetividade da interdição. Casar sim, mas apenas quando esse desejo é um engendramento que envolve a existência, e não por razões de ordem impulsiva. E se não der certo, quando os movimentos, os encontros e os afetos forem outros, que prevaleça o mesmo amor que uniu, e que cada um procure o seu caminho, com respeito e dignidade. Por isso, para as lindinhas Hilary e Julie, a gente diz: VALEU, GATAS! Sentiu a brisa, Neném?
Φ CASAIS HOMOERÓTICOS SE REÚNEM PARA PROTESTAR PELO DIREITO AO CASAMENTO. Na última quinta-feira, uma brisa arrasou os EUA. Milhares de casais LGBT e aliados foram a cartórios em suas cidades para protestar pelo direito não-assegurado de se casar. O evento faz parte da semana “Freedom to Marry”, organizado pelas entidades LGBT daquele país. Atualmente, apenas nas cidades de Massachussets e Connecticut a união é permitida. Enquanto a sociedade se organizar em torno do modelo familiar, e a garatia de direitos civis se der em torno deste modelo, a todas as pessoas deve ser permitida a união, com quem quiser e da forma que quiser. Mas, como já dissemos, só vale se for como expressão afetiva-afetante de um existir para o mundo, com respeito, desejando a diferença do outro. Abrindo-se para uma composição que crie um corpo-casal produtor de saberes e dizeres para a criação de outras ondas de intensidade e outras formas de relação. Isso vale para qualquer casal, homo, hetero… Sentiu a brisa, Neném?
Φ EXALTAÇÃO DA DOR: CAMISETAS CULPOSAS FAZEM SUCESSO. Égua, maninha, isso aqui é do Brasil ou dos States? Só tem notícia de lá. Calma, benzinho. É que certas coisas a gente aproveita pra comentar e dar toque, mesmo que elas não tenham lá tanta importância. Essa, por exemplo. Nos EUA, uma igreja chamada Movimento de Paixão por Cristo lançou uma grife de camisas de expiação da culpa. Com dizeres como “ex-homossexual”, “ex-hipócrita”, “ex-fornicador”, “ex-masturbador”, a grife é sucesso entre os amantes da dor, da culpa e do ressentimento. Quem te garante que a moda não chega por aqui, baby? O recrudescimento moral das relações sociais é perigosíssimo, foi neste clima de crise econômica e aperto moral que surgiram coisas como o nazismo e o fascismo. Isso só se combate com inteligência, ternura e humor. Imagina que coisa mais pintosa andar com uma camisa “ex-homossexual” por aí, dando pinta? De qualquer forma tem que tomar cuidado, são pessoas desesperadas, irracionais, e por isso mesmo perigosas. A questão é saber que o sentimento de culpa se segura na má consciência, o ódio contra si mesmo. Não alimentar esse ódio é necessário. Mas numa boa, com alegria, quem sabe a pessoa acabe descobrindo que ser “ex” não significa que não possa ter um (ou muitos) revivals... Sentiu a brisa, Neném?
Beijucas, até a próxima, e lembrem-se, menin@s:
FAÇA O MUNDO GAY!