Tal como no ano passado, quando Brasil e Índia se retiraram dois dias antes das negociações da OMC (Organização Mundial do Comércio), que visam a liberalização do comércio mundial, e a rodada foi interrompida, também agora ela tende a não se movimentar de onde nunca saiu. Já começou bem, uma vez que o Brasil confirma logo de chegada, na segunda-feira, a sua posição sobre as propostas que ocorreram, isto é, que não se submete aos ditames dos impérios americano e europeu. Que diga o lúcido ministro Celso Amorim, que chamou o primeiro dia de negociações (ou melhor, de não negociações) de “totalmente inútil”.

Antes disso, no sábado passado, Amorim causou frisson na mídia mundial e achaques nos ofendidos ianques, ao referir-se sobre a falta de alguma proposta igualitária, enquanto se tenta insinuar que Brasil e Índia estão boicotando Doha, lembrando a frase que o ministro da propaganda nazista, Goebels, disse a Hitler: “Uma mentira contada mil vezes torna-se verdade”.

Susan Schwab, representante comercial dos EUA, dizendo-se descendente de sobreviventes do holocausto, eriçou-se. Amorim, que sabe pra que serve a diplomacia, pediu desculpas, mas, deixando de lado as falseações diplomáticas, afirmou ao final: “Mantenho: repetir uma distorção faz com que as pessoas acreditem que ela é a verdade”.

Desde 2001, as negociações não acontecem devido aos chamados países desenvolvidos quererem a liberalização das fronteiras alfandegárias para seus produtos industriais e serviços, mas sem diminuir as barreiras de exportação agrícola que querem os chamados países em desenvolvimento. Para que se tenha idéia da questão, todos os 153 países membros da Rodada têm de ratificar as decisões para que ela possa ser aprovada.

O principal emperrador, mais do que os grandes europeus, de qualquer decisão que se possa dizer minimamente justa na Rodada é mais uma vez o Império Americano. Ontem, a representante Susan Schwab baixou a proposta para cobrança de subsídios alfandegários para os produtos agrícolas, que era de US$ 17 bilhões, para US$ 15 bilhões. No entanto, para Amorim, uma proposta aí só será analisada como aceitável se estiver abaixo dos US$ 13 bilhões.

Se for pelo presidente boliviano, Evo Morales, da forma que vem sendo realizada, a Rodada seria apenas uma forma de tentar oficializar com a assinatura dos países pobres, vantagens capitalísticas para um pequeno número de países ricos:

As negociações na OMC converteram-se num combate dos países desenvolvidos para abrir o mercado dos países em desenvolvimento a favor das suas grandes empresas.”

Para os sul-americanos, a melhor proposta, saia ou não alguma consonância da Rodada de Doha, é fortalecer o Mercosul e outros acordo unilaterais e multilaterais, principalmente — para além do G8 e do G4 de Doha — o G20, que deve se tornar 60, 80, 130, 200… Quando a Rodada de Doha estará de vez enferrujada sem ter dado uma volta e o enunciado de Goebels não encontrar mais possibilidade de serialização. Por enquanto, Amorim e Evo seguem usando a língua, como diriam Deleuze/Guattari, não como questão de Lingüística, mas de política.

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