A Face Vazia

O governo Bush é uma produção do capitalismo financeiro mundializado. Há quem ainda acredite que o próprio Bush filho seja o grande mal, o responsável exclusivo pela política internacional belicista e imperial norte-americana. Mas é necessário compreender o fenômeno a partir da observação das obviedades.

Por trás do marketing eleitoral do governo Bush existe uma outra máquina produtora de lucro que se alimenta da dor e da existência das pessoas. Quantos lobistas são necessários para se vender uma guerra? Certamente, há os da indústria bélica, mas ainda os da alimentícia, de entretenimento, da mass media, das empresas exploradoras de petróleo, as empreiteiras, logística, etc. Há os congressistas oportunistas que se elegem com um discurso apocalíptico, se aproveitando do medo disseminado pelas mídias. Os carreiristas burocráticos que, sem levantar de suas mesas, tomam decisões que afetam milhares de pessoas do outro lado do mundo. Todos ganham com isso*. Quem perde? Os iraquianos, de qualquer facção, os palestinos, os israelenses que apóiam a convivência com outros modos de existir, os soldados americanos, iludidos com o ideal da pátria ou capturados pela necessidade do emprego fácil, os pobres, os descorporativizados** do mundo.

No entanto, mesmo com todo o aparato tecnológico midiático produtor de factóides da grande mídia, o marketing sobre o governo Bush não consegue mais salvar seu produto. As pesquisas mostram, desde algum tempo, que ele não tem mais o apoio da população americana, e que o anti-americanismo no mundo nunca foi tão intenso. Como sempre, em um barco que afunda lentamente, os ratos são os primeiros a abandonar.

Primeiro foi a mídia, que antes oferecia seus truques e trucagens para ocultar o massacre de jovens norte-americanos, iraquianos, palestinos e afegãos nas guerras mundo afora, e que agora, no afã de não perder a boca da audiência, quis entrar na caça aos culpados como se também não o fosse.

Depois, seus consortes, auxiliares que em suas respectivas áreas produziram as condições para a venda do produto guerra como necessário ao país. Primeiro, saiu Colin Powell, secretário de Estado, principal porta-voz da política externa dos EUA. Depois o povo americano deu a vitória aos democratas nas eleições legislativas, e o congresso americano passou de submisso a crítico dos planos belicistas do governo Bush. Ainda, após escândalo de espionagem no qual tornou público o nome de uma agente da CIA, o chamado “cérebro” do governo, Karl Rove, que arquitetou todas as eleições do atual presidente, inclusive a última, fraudulenta, também está sob investigação e se afastou do governo (segundo alguns articulistas, porque falhou em manter os índices de popularidade de seu patrão em alta).

E hoje, foi o procurador geral (cargo semelhante ao de ministro da justiça), Alberto González. O agora ex-procurador geral era o pilar legal de todas as ações do governo. Responsável pela elaboração das rígidas leis contra a imigração, e pelo pacote de medidas anti-terrorismo, que dava ao executivo federal o direito de espionar qualquer cidadão, sem restrições, ainda pela posição norte-americana ante a convenção de Genebra e o Tribunal Penal Internacional. Foi acusado de demitir oito procuradores gerais que tomaram decisões contrárias aos interesses do governo, e elaborou o documento que sustentou juridicamente as torturas nas prisões de Abu-Ghraib e Guantánamo. É acusado ainda de falso testemunho ao Congresso Americano nas investigações sobre abusos da CIA na espionagem de cidadãos.

À subjetividade do capital não interessam os rostos, os personagens, mas sim que o modo de produção se perpetue, como um buraco negro que se alimenta de corpos. Bush, assim como outros presidentes, primeiros-ministros e outras autoridades, embora carreguem em si elementos de ordem patológica e que compõem com esta subjetividade, não são a sua causa, mas tão somente conseqüência.

É preciso enfraquecer a linha dura do capital, nas suas microrrelações e no seu alcance capilar. Para que mais bushes não sejam mais necessários.

* Sobre os lobbies que lucraram com a guerra, ver o documentário de Michal Moore, Fahrenheit 9/11.

** Descorporativizados diz respeito ao deslocamento das relações de força do capital, que se concentra nos interesses de lucros das grandes corporações, as quais elegem congressistas, senadores e presidentes, que governarão de acordo com seus interesses. Quem está fora deste corporativismo, está fora da lógica do capital.

1 thought on “BUSH E A FACE DO CAPITALISMO

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