LULA, O ECON’OTIMISTA E O OLHAR ARGUTO DE DELFIM NETTO

2

A Economia, como bem mostra o filosofante Toni Negri, é uma disciplina do homem. É, pois, um corpus de saberes e dizeres que se modifica de acordo com as condições materiais e imaterias de cada época. Assim como os filósofos são fruto de sua época, a economia de cada tempo exprime os conflitos e a relação do homem em sociedade e em relação à natureza.

Os tecnocratas, à serviço – voluntário ou não – da subjetividade capitalística, que tenta reduzir à órbita do Significante Despótico os saberes e os signos culturais, produções humanas nas suas mais diversas vertentes, crêem numa economia científica. Cientificidade dura, que dispensa os elementos “intempestivos” e se aferrando a uma lógica silogística e estéril. Equívoco comum à, por exemplo, ciência física moderna, como afirma o filosofante dos saberes, Michel Serres, para quem a física é physys, passando por Lucrécio, Demócrito, Epicuro, não se reduz ao saber que lamina aquilo que não cabe em sua codificação, mas transborda na existência e no filosofar.

Não muito longe da filosofia e da ciência intempestiva, o economista Delfim Netto (que o jornal O Estado de São Paulo, quando lhe é oportuno, recorda que foi ministro da ditadura militar) afirma um alicerce da disciplina econômica: o trabalho e as relações humanas.

Com seu saque para além dos “cabeças de planilha”, alcunha dada pelo também economista que salta do senso banal, Luis Nassif aos tecnocratas, Delfim deita e rola, afirmando que o único economista que presta no Brasil é Lula.

Afirma Delfim que a economia se dá a partir do trabalho e do pacto social. Portanto, uma alcunhada crise como a que se avizinha nada mais é do que produto da especulação do mercado financeiro, e da quebra do pacto social realizada pelos banqueiros e investidores. A crise, lê-se nas entrelinhas, é de moral econômica.

Lula (alcunhado “O Otimista”, pela grande imprensa), sabe, como qualquer estadista, que a confiança no futuro determina os investimentos. As frases de Lula, capturadas como estúpidas e levianas pela imprensa, caem ao ouvido da população como um diálogo, uma explicação para além dos códigos metodológicos da economia de cátedra. Daí Delfim desmontar: a vantagem de Lula é não ter diploma superior! Para estupefação dos entrevistadores. Ele sabe: caso tivesse passado pela sobrecidificação da academia, talvez Lula não fosse Lula, o Otimista. Talvez não soubesse que a parte mais importante da economia não se traduz em números, mas emerge das relações sociais. Coisa que a ala misógina da economia desconhece.

Sabiamente, o economista da direita que muito esquerdista inveja não faz previsões econômicas: sabe bem que elas só interessam à especulação e à produção de uma condição de instabilidade e desconfiança. Não são previsões, são votos. Votos de que o país vá mal, e a direita tenha algum fio de esperança eleitoral em 2010.

UMA ANALOGIA LITERÁRIA-ECONÔMICA

O escritor polonês Jerzy Kosinski, em seu romance “O Vidiota”, faz um quadro da sociedade estadunidense que é, em outra análise, a analogia da sociedade do consumo que move a economia atual.

A personagem principal, Chauncey Gardiner, ou simplesmente ‘Chance’ jamais viu o mundo fora dos jardins da casa onde nasceu, e todo o conhecimento que possui advém da televisão. Um dia, com a morte do dono da casa, ele é obrigado a sair. Em seus caminhos, nos acasos dos encontros, é atropelado e levado a se hospedar na casa de um rico empresário. Gardiner é monossilábico e incapaz de travar um diálogo. Reduz-se a repetir os slogans e falas de programas de tevê. Ainda assim, suas frases prontas sobre jardinagem e tiradas de programas de televisão atingem em cheio um grupo de empresários às voltas com uma crise financeira que ameaça o país. Sempre repetindo suas frases, sem entender uma vírgula do que lhe acontece ao redor, Chance vai se tornando cada vez mais um rosto conhecido midiaticamente, a ponto de ser entrevistado no principal programa de tevê dos EUA. Entre mil e uma tentativas do serviço secreto americano encontrar pistas sobre o seu passado, Chance se torna o principal conselheiro econômico do presidente estadunidense. O conto-romance termina com as especulações do grupo econômico às voltas com a eleição presidencial, e o nome de Chance é o mais provável para vencer o pleito.

Em meio à espetacularização do Real promovida pela própria sociedade, ouve-se a voz da personagem: “Neste país, quando sonhamos com a realidade, a televisão nos desperta. Acho que a guerra, para milhões, é apenas mais um programa de tevê. Mas lá longe, na frente de batalha, homens de carne e osso estão entregando suas vidas”. A Faixa de Gaza que o diga.

Lula, que está para a personagem principal do conto-romance menos que o seu colega, Obama, sabe que o otimismo, neste momento, é uma estratégia de luta. E que, nesse quesito, a população está a seu lado.

Arriscamo-nos uma previsão: como em 2002 e 2006, as viúvas do trágico porvir vão errar.

2 thoughts on “LULA, O ECON’OTIMISTA E O OLHAR ARGUTO DE DELFIM NETTO

  1. Ronaldo Rhusso, poeta
    que na eisthésis criadora de novos mundos sabe
    que toda poética é política
    assim como toda política é poética
    ou não é política
    muito menos poética…
    Abraços afinados!

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.