DOIS ANOS DE GUERRA EM GAZA: DEVASTAÇÃO, ISOLAMENTO E INCERTEZAS MARCAM O CONFLITO MAIS SANGRENTO DO SÉCULO

Desde outubro de 2023, Gaza vive colapso humanitário e Israel enfrenta crescente isolamento internacional
Dois anos após os ataques do Hamas contra Israel, em 7 de outubro de 2023, o conflito que devastou a Faixa de Gaza chega a uma encruzilhada. O balanço é brutal: dezenas de milhares de mortos, cidades arrasadas, fome generalizada e uma crise política e diplomática que redesenhou o Oriente Médio. As tentativas de cessar-fogo seguem cercadas de desconfiança e ocorrem sobre os escombros de uma destruição sem precedentes.
O dia que mudou tudo
Na manhã de 7 de outubro de 2023, o grupo extremista Hamas lançou um ataque coordenado contra Israel, matando mais de 1.300 pessoas e sequestrando 251. Dos reféns, apenas cerca de 20 seguem vivos sob custódia; outros 25 teriam sido mortos, mas seus corpos ainda não foram devolvidos às famílias.
O episódio provocou uma resposta militar de escala inédita. Sob o comando do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, Israel iniciou uma ofensiva total contra Gaza, com o objetivo declarado de eliminar o Hamas — e, segundo a ONU, deu início a uma campanha cujas consequências “terão impacto humanitário e político que será sentido por anos”.
Uma Faixa em ruínas
Em Gaza, os números ultrapassam qualquer medida de tragédia: mais de 67 mil palestinos mortos, incluindo mulheres e crianças — a maioria civis. A violência deslocou 2 milhões de pessoas, sobrecarregou hospitais e deixou o território à beira do colapso humanitário.
A destruição é quase total. 82% das empresas foram danificadas ou destruídas, o PIB encolheu 81% em 2023, e a economia opera hoje com menos de um sexto do que era antes da guerra. O desemprego ultrapassa 80%, a fome foi oficialmente declarada e a inflação atingiu níveis catastróficos.
Entre 80% e 96% dos ativos agrícolas foram destruídos, inviabilizando a produção local de alimentos. A maioria dos bancos e caixas eletrônicos foi atingida, e Israel bloqueou a entrada de novas moedas. Sem circulação de dinheiro, o comércio parou. Gaza tornou-se dependente quase exclusivamente de ajuda humanitária, que chega de forma intermitente e insuficiente diante dos bloqueios israelenses.
Israel isolado e a ONU enfraquecida
Enquanto Gaza agoniza, Israel enfrenta crescente isolamento internacional. Mesmo aliados históricos, como países europeus, têm imposto restrições à cooperação militar e pressionado por um cessar-fogo. Na Assembleia Geral da ONU, em setembro, dezenas de delegações deixaram o plenário quando Netanyahu iniciou seu discurso — um gesto simbólico de repúdio global.
O desgaste atingiu também a própria ONU, incapaz de aprovar resoluções efetivas no Conselho de Segurança devido a vetos sucessivos dos Estados Unidos, principal aliado de Israel. Internamente, a organização enfrenta críticas por sua lentidão e timidez em denunciar as violações em Gaza.
Somente no mês passado, quase dois anos após o início da guerra, um comitê de investigação concluiu que Israel conduz “um genocídio” contra o povo palestino.
O plano de paz e os impasses
Enquanto o número de vítimas cresce, diplomatas tentam evitar que o conflito entre em seu terceiro ano. Um novo plano proposto pelos Estados Unidos, com mediação do Egito e do Catar, prevê cessar-fogo imediato, libertação dos reféns e a criação de um comitê internacional para administrar Gaza.
De acordo com a Casa Branca, o documento estabelece a formação de uma zona livre de grupos armados e abre caminho, ainda que de forma condicionada, para o reconhecimento de um Estado palestino.
O Hamas sinalizou apoio parcial à proposta, aceitando libertar reféns e entregar o governo de Gaza a um órgão independente. Mas o grupo não esclareceu se concorda com o desarmamento, exigência central de Israel. Netanyahu, por sua vez, apoia o plano em linhas gerais, mas rejeita categoricamente a criação de um Estado palestino.
Uma guerra que transformou o Oriente Médio
O conflito não apenas devastou Gaza, mas também redesenhou o equilíbrio regional. O chamado “escudo” do Irã — formado por alianças com o Hezbollah, o Hamas e os Houthis — foi abalado após ataques israelenses à Síria e ao próprio território iraniano. A morte de líderes-chave enfraqueceu o Hezbollah, e a queda do regime de Bashar al-Assad, em dezembro de 2024, consolidou o cenário de instabilidade.
Dentro de Israel, o custo da guerra é estimado em US$ 100 bilhões, o déficit público chegou a 6%, e cortes em saúde e educação alimentaram protestos. Netanyahu, cada vez mais pressionado internamente e alvo de processos por crimes de guerra em cortes internacionais, tenta equilibrar sua sobrevivência política com o crescente isolamento diplomático.
A guerra entre Israel e o Hamas tornou-se o conflito mais devastador do século XXI, um divisor de águas para a política internacional e para o próprio conceito de segurança global. O Oriente Médio, mais fragmentado e imprevisível, ainda busca um novo ponto de equilíbrio.