LUIS NASSIF: O CASO MALU GASPAR E A INACREDITÁVEL EQUIPARAÇÃO AO CASO WATERGATE
afinsophia 28/12/2025 0
A ofensiva contra Alexandre de Moraes não se deve aos seus defeitos, mas ao seu papel de âncora da democracia contra o golpismo

O caso Malu Gaspar deflagrou uma discussão curiosa sobre princípios do jornalismo e da reportagem. Até a, em geral, prudente ombudsman da Folha embarcou na retórica das falsas analogias
Diz ela, citando um colega:
- Jornalista não precisa apresentar provas, isto é papel da Justiça. Está correta.
- Watergate começou com uma denúncia sem provas e, com o tempo, resultou na queda de Nixon.
Qual a lógica dela? Como tanto Watergate quanto o caso Malu Gaspar têm em comum a não apresentação (inicial) de provas. Logo, as denúncias de Malu têm tanto peso quanto às de Watergate. Tenha a santa paciência!
Malu trouxe uma informação concreta: o contrato do escritório da família de Alexandre de Moraes com o Banco Master. Não bastou. Trouxe, então, um reforço: a suposta interferência de Moraes no BC, na forma de 4 telefonemas e uma reunião presencial com o presidente do BC, Gabriel Galípolo, para supostamente tentar reverter a decisão do BC, de liquidar o Master.
O contrato advocatício atenta contra a ética. A suposta interferência direta do Ministro pode ser enquadrada em crime. Justamente por isso exigiria um conjunto de evidências que fortalecesse a versão apresentada.
Qual a evidência? A informação vaga de que se baseara em 5 fontes do mercado e uma do Banco Central. Logo em seguida duas colegas, de outros jornais, soltaram a mesma denúncia, baseada nas mesmas fontes.
Na era do WhatsApp, basta uma pessoa chegar em um grupo e dar uma informação sensível. Imediatamente todas as pessoas do grupo passam a deter a tal informação. Apenas uma supostamente teve acesso à fonte original. Mas todas as 6, agora, têm a informação.
Ainda mais sabendo que um dos recursos de impacto da jornalista, em suas notas, sempre foi a de usar fontes individuais de forma genérica, um estilo que acaba permitindo que uma mera nota irrelevante, de repente, ganhe peso jornalístico aos olhos do leigo . Ficou famosa a série de “tal medida provocou mal-estar nos militares”, como se o sentimento fosse de todos os militares.
Por exemplo, há uma divisão no STF entre dois grupos, cisão conhecida. O título da nota será : “Decisão de Moraes causa mal estar no Supremo”. E, aí, ingressa-se em um estilo peculiar de caça-likes, que consiste em esquentar informações secundárias.
Não apenas isso.
Outro indicador da parcialidade da mídia – e de repórteres – é a seletividade das denúncias.
Vamos a dois casos emblemáticos:
- O Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Jhonatan de Jesus, indicado pelo PL, questionou diretamente o Banco Central, pediu informações detalhadas em 72 horas, para comprovar se o Master não poderia ter sido salvo via mercado. Intenção óbvia de tentar uma reversão da liquidação. Repercussão mínima na imprensa.
- O Ministro Dias Toffoli convoca o diretor de fiscalização do BC e um diretor do BRB para esclarecer a demora do BC em impedir as aventuras do Master. Nenhum indício de que tentaria reverter a liquidação do banco. Mas soltam balões de ensaio, dizendo que Toffoli pretenderia ressuscitar o Master, gerando um sem-número de protestos em cima do nada.
O que se tem a esclarecer
O ponto central a ser esclarecido não são as circunstâncias da liquidação do Master, mas a razão do BC ter demorado tanto tempo para liquidar a instituição – e aí se remete ao período de Roberto Campos Neto. Gabriel Galípolo cumpriu seu papel, enviando os inquéritos para o Ministério Público Federal.
Mas desde 2019 havia sinais de que o Master era uma pirâmide. E os golpes não se limitaram aos fundos municipais de previdência, ou à constituição de ativos falsos para rechear seus fundos. O mercado sabia que era um golpe, mas grandes instituições lucraram muito colocando os papéis do Master no mercado. Colocavam as cotas dos fundos, recebiam suas taxas de corretagem e os clientes que explodissem mais à frente.
E aí se volta às denúncias seletivas. Nada se fala sobre os volumes expressivos de títulos do Master vendidos pela XP e pelo BTG. Nada se fala sobre a paralisação dos processos do Master no Banco Central.
Pouquíssimo se falou sobre o envolvimento de Campos Neto com operações de lavagem de dinheiro, quando presidia a Tesouraria do Santander e, depois, como presidente do BC, sobre as normas que adotou para flexibilizar o mercado, abrindo espaço para a enorme zorra posterior.
A ofensiva contra Alexandre de Moraes não se deve aos seus defeitos, mas ao seu papel de âncora da democracia contra o golpismo, e um dos aríetes do STF para deslindar a mais ampla teia de corrupção já instalada no país: o sistema de lavagem de dinheiro incrustado na Faria Lima. E as reações não vêm só do sistema lavajatista.
Pelo visto, André Esteves, um dos donos do país, aprendeu bem com seu antecessor, Daniel Dantas: não basta cooptar a mídia mainstream.