ALMINO AFONSO, EX- MINISTRO DE JOÃO GOULART: “PRISÃO DE MILITARES GOLPISTAS EM 2025 É LIÇÃO RETROSPECTIVA AO BRASIL”

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DITADURA NUNCA MAIS

Almino relembra os episódios dramáticos do golpe e comenta o contexto atual envolvendo a punição a militares golpistas

‘Louvo que tenha sido possível calar quem tentou um golpe ‘ afirma Almino Affonso| Crédito: Tribunal de Contas do Estado de São Paulo

A punição a militares golpistas em 2025 é uma lição retrospectiva que poderia ter sido aplicada com maior contundência no passado. A afirmação é do ex-ministro do Trabalho de João Goulart, Almino Affonso, que testemunhou os bastidores da conspiração que derrubou o governo e instaurou uma ditadura de 21 anos.

“Portanto, louvo que, de maneira mais contundente, tenha sido possível agora, através de medidas estritamente institucionais, calar aqueles que tentaram dar um golpe de maneira cruel contra a democracia”, posiciona-se.

“Na época, quando analisamos o quadro em que vivíamos, era um período de longa efervescência social e política”, explica ao BdF Entrevista, da Rádio Brasil de Fato. “Por conta disso, cria-se ainda hoje uma área de análise crítica e por vezes contundente sobre o governo de João Goulart”, continua.

Affonso destaca que, durante o breve governo de Jango, foram promovidas ao primeiro plano econômico e social áreas até então ignoradas, como o campo, a reforma agrária e o respeito aos direitos do sindicalismo rural. “Não apenas isso, mas diversas áreas de importância econômica e social estavam em plena efervescência. Não havia lógica que justificasse sua interrupção, mas ela aconteceu”, afirma.

“Foi dramático para todos nós”, enfatiza e acrescenta: “Uma parte significativa da vida pública foi cortada durante anos, em toda a América do Sul, no Chile, Uruguai, Argentina, Peru, México… Foi um período extremamente negativo e que durou muito para que fosse possível para o país ressurgir e houvesse uma abertura democrática”.

Relembrando o período da ditadura militar no país, ele cita o general Amaury Kruel. Na noite do dia 31 de março de 1964, o general e comandante do segundo Exército tentou barganhar a mobilização de suas tropas para resistir ao golpe em marcha. Kruel apresentou a Jango as seguintes condições: romper com os “comunistas”, demitir ministros “radicais” e pôr na ilegalidade a intersindical Comando Geral dos Trabalhadores.

“Ele era, não só compadre de Jango, como padrinho de seu filho. Realmente não dá para entender.”

O ex-ministro explica que a pergunta sobre a insuficiência militar para barrar o golpe de 1964 é “a mais difícil”. Ele vê um paradoxo: análises apressadas atribuem a “profundidade” do golpe apenas à pressão estadunidense. “A intervenção direta ou indireta dos EUA jogou um papel decisivo nesse momento”, reconhece.

No mesmo período, diz, houve uma intervenção ostensiva dos Estados Unidos em golpes de outros países na América Latina: na Bolívia (1964), que levou René Barrientos ao poder; no Chile (1973), liderado por Augusto Pinochet; e na Argentina (1976), comandado por Jorge Rafael Videla.

Em O Governo João Goulart: as lutas sociais no Brasil, 1961-1964, Moniz Bandeira afirma que havia financiamento direto do governo Kennedy e da CIA às milícias armadas da extrema direita, a Carlos Lacerda na Guanabara e a Magalhães Pinto em Minas Gerais, para conspirar contra a administração de Goulart.

“Com o agravante de que [Kennedy] tinha feito um discurso quando tomou posse cheio de vanglórias de dizer: seremos amigos dos que querem a democracia, mas foi o oposto”, aponta Affonso.

Legado de Jango em 2025

O último ministro vivo, Almino Affonso, destaca que a própria resistência contra o golpe é um legado que se mantém desde o governo de João Goulart. “Quem sabe com essa retomada democrática, que me parece abençoada, se dê para muitos a condição de uma clareza”, avalia.

Mas alerta para o parlamento, que lhe causa inquietação por não ter o “mínimo de convergência natural”. “Não há uma liderança que se apresente e diga “eu defendo tal coisa”. Isso leva Lula, por exemplo, a se reunir com o presidente da Câmara para tentar aliviar tensões, quando o normal seria a presunção de um parlamento que tem tudo para crescer e ser grande”, conclui.

Para ouvir e assistir

BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato, o programa é veiculado às 19h.

Editado por: Maria Teresa Cruz

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