“VIAGEM EXITOSA”: LULA VOLTA DE VIAGEM À ÁSIA COM TRIUNFOS NA BAGAGEM

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AGENDA INTERNACIONAL

Presidente fechou acordos com a Indonésia, recebeu título de Doutor Honoris Causa na Malásia e ainda se reuniu com Trump

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No dia em que completa 80 anos, nesta segunda (27), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encerrou uma viagem de quase uma semana pela Ásia. Antes de embarcar de volta ao Brasil, o presidente fez um balanço aos jornalistas que acompanharam a agenda internacional do mandatário. 

“É mais uma viagem exitosa do governo brasileiro ao exterior. Temos um potencial extraordinário em todas as áreas para crescer a relação com a Indonésia, uma relação muito boa construída com o presidente Prabowo Subianto. E eu nunca tinha vindo à Malásia, e o primeiro-ministro Anwar Ibrahim é uma figura extraordinariamente agradável, que gosta do Brasil, que quer ter uma relação forte com o povo brasileiro”, afirmou o presidente. 

O presidente destacou a presença de quase 100 empresários brasileiros em sua comitiva, e celebrou a possibilidade de abertura de novos mercados na Ásia. “O presidente não faz negócio, ele abre portas. E a receptividade tem sido extraordinária. Há muita vontade de conhecer o Brasil, de conhecer a transição energética que o Brasil está pensando”, disse o presidente.

O professor titular de Direito Internacional Público da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Paulo Borba Casella avalia que o atual governo tem cumprido com a tarefa de recolocar o Brasil no cenário das relações internacionais, e que o presidente volta ao Brasil com alguns triunfos na bagagem. 

“O Brasil nunca tinha estado tão isolado e tão deixado de lado como foi pelas atitudes do então presidente [Jair Bolsonaro] e do governo dele. Então essa ênfase do Lula desde que começou o terceiro mandato, em janeiro de 2023, de colocar de novo o Brasil no contexto internacional, isso faz muito sentido, porque o Brasil não é uma potência hegemônica nem econômica, nem politicamente, mas o Brasil sempre construiu uma relação baseada na diplomacia, no direito internacional, na solução pacífica de controversas”, analisa Casella. 

Primeira parada: Indonésia

Na quinta-feira (23), Lula desembarcou em Jacarta, na Indonésia, para uma visita oficial de dois dias, em retribuição à vinda ao Brasil do presidente indonésio Prabowo Subianto, em julho passado. 

Durante o encontro bilateral, foram assinados acordos sobre cooperação em medidas sanitárias e fitossanitárias e em questões de certificação de produtos, visando ampliar o intercâmbio comercial entre os dois países. A Indonésia é um dos principais parceiros comerciais do Brasil na Ásia, sendo o 16º maior destino das exportações brasileiras. Em 2024, o fluxo comercial entre os dois países chegou aos US$ 6,3 bilhões, com superávit de US$ 2,6 bilhões para o Brasil.

“É quase que inexplicável para as nossas sociedades como é que dois países importantes no mundo, como Indonésia e Brasil, que os dois juntos perfazem quase 500 milhões de habitantes, só tenham um comércio de US$ 6 bilhões. É pouco, presidente, é pouco para a Indonésia, é pouco para o Brasil, e eu acho que o povo da Indonésia e o povo do Brasil merecem que nós façamos um sacrifício maior para garantir que o comércio entre Indonésia e Brasil cresça de acordo com o crescimento da nossa população”, afirmou Lula diante de seu homólogo indonésio.

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado de seu homólogo indonésio, Prabowo Subianto, durante cerimônia de assinatura de atos. Palácio Merdeka, em Jacarta (Indonésia). Foto: Ricardo Stuckert/PR

Ainda em Jacarta, o presidente participou do Fórum Empresarial Brasil-Indonésia, com a presença de mais de 100 empresários, entre brasileiros e indonésios. Um dos focos do discurso do presidente foi a transição energética e a produção de biocombustíveis.  

“O Brasil não quer apenas vender para a Indonésia. Apostamos em uma parceria equilibrada e mutuamente benéfica. Como dois dos maiores produtores de bioenergia do mundo, podemos criar juntos um mercado global de biocombustíveis. A Organização Marítima Internacional não pode adiar eternamente a decisão de descarbonizar o setor. O biocombustível de etanol é uma alternativa viável e imediatamente disponível”, disse Lula, durante a atividade.

O presidente destacou a iniciativa conjunta de Brasil e Indonésia para a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), uma das principais iniciativas da presidência brasileira à frente da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), que será lançado durante o evento, em novembro, em Belém (PA). “Vamos mostrar que é possível promover desenvolvimento, enfrentar a mudança do clima e proteger as florestas tropicais e sua biodiversidade. O apoio da Indonésia ao fundo tem sido fundamental”, disse o presidente. 

“Fizemos oito acordos aqui. Tem uma perspectiva extraordinária em várias atividades e acho que os ministros saem otimistas. Eu saio otimista”, disse Lula, pouco antes de se deixar a capital da Indonésia. 

Doutor Honoris Causa 

De Jacarta, Lula partiu rumo a Kuala Lumpur, na Malásia, na sexta-feira (24), levando na bagagem a expectativa para o encontro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que ocorreu no domingo (26). 

Antes, no sábado (25), o presidente recebeu o título de Doutor Honoris Causa em Filosofia e Desenvolvimento Internacional e Sul Global, concedido pela Universidade Nacional da Malásia (UKM). “A minha trajetória remete à história de superação de milhões de compatriotas. Este título é, também, um merecido reconhecimento ao povo brasileiro”, declarou o presidente, na cerimônia de concessão do título.

A homenagem reconhece a trajetória política de Lula e sua atuação no campo da inclusão social, do combate à fome e da cooperação internacional. “Recebo o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Nacional da Malásia não como um ponto de chegada, mas como um estímulo a continuar lutando por um mundo mais justo, sustentável e solidário. Um mundo em que os países do Sul Global tenham voz”, disse Lula, em seu discurso de agradecimento. “Esse diploma não é do Lula. É de 215 milhões de brasileiros”, completou.

Encontro com Trump

A agenda bilateral mais importante da viagem à Ásia acabou sendo com um líder ocidental: o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para tratar das tarifas impostas às exportações brasileiras. 

Durante a conversa, que durou cerca de 50 minutos, o presidente brasileiro disse ter entregue ao homólogo um documento impresso com as informações precisas a respeito da relação comercial entre os Estados Unidos, e solicitou diretamente a Trump a suspensão das tarifas a produtos brasileiros. 

“Fiz questão de dizer a ele que eram infundadas as informações de que os Estados Unidos tinham déficit comercial com o Brasil. Nós provamos que houve superávit de US$ 410 bilhões em 15 anos. Só no ano passado foram quase US$ 22 bilhões de superávit para os Estados Unidos. Em todo o G20 só há três países em que os Estados Unidos são superavitários: Brasil, Reino Unido e Austrália”, reforçou Lula.

Segundo o ministério de Relações Exteriores (MRE) do Brasil, Lula também falou com Trump sobre a imposição de sanções, a partir da aplicação da Lei Magnitsky, a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), qualificando a medida como “injusta”, uma vez que “respeitou-se o devido processo legal e não houve nenhuma perseguição”.

Durante o encontro, os presidentes foram questionados por jornalistas sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o que causou reação do presidente brasileiro. Já Trump, fez elogios ao ex-presidente, mas evitou comentar o assunto. Posteriormente, o presidente Lula afirmou que o estadunidense “sabe que rei morto, rei posto”, e que esse tema não está em debate.

Lula e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se encontraram na Malásia. Foto: Ricardo Stuckert/PR

Casella avalia que diplomacia brasileira acertou em acordar a reunião na Malásia, um território neutro, em que os dois presidentes puderam dialogar “em pé de igualdade”.

“Estavam os dois governantes numa situação de igualdade. E se o [Donald] Trump fosse desagradável ou começasse a falar coisas absurdas, era só o Lula levantar e sair. Eu acho que isso foi muito bem pensado para neutralizar esse tipo de situação”, avalia o professor, alertando que o recuo de Trump não significa um mea culpa do governo estadunidense. 

“Trump não é um estadista, ele nunca fala em direito internacional, ele é um especulador imobiliário que está presidente dos Estados Unidos. Ele vê interesses e ele vê como ele pode alavancar esses interesses para o que ele acha que é mais útil. Então essa conversa com o Brasil e uma eventual redução ou eliminação dessa chantagem tarifária, não é porque ele se deu conta de que cometeu abusos e ilegalidades e não é porque ele está sendo razoável. É por uma questão de interesse”, pondera Casella.

“Eles começaram a gritar que os preços estão aumentando, a inflação está aumentando. E o consumidor dos EUA é também eleitor, ele pode se lembrar de votar contra esse governo no final do ano que vem eles têm eleições legislativas”, completa.

Para Casella, a chantagem bolsonarista falhou, em referência à articulação de Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo em defesa das sanções contra o Brasil. “Se num primeiro momento foi citado o Bolsonaro, acho que eles já perceberam que o Judiciário brasileiro não se comoveu com as ameaças e não mudou sua linha de atuação e nem poderia”, avalia.

Agressão estadunidense contra a Venezuela 

A escalada militar dos Estados Unidos na região do Caribe e o assédio à Venezuela também foi tema da conversa. Segundo o chanceler Mauro Vieira, o presidente brasileiro se colocou à disposição para ser o interlocutor entre os dois governos, no sentido de evitar uma agressão armada ao país sul-americano.

“O presidente Lula levantou o tema e disse que a América Latina e a América do Sul, onde estamos, é uma região de paz. E ele se prontificou a ser um contato, um interlocutor, como já foi no passado, com a Venezuela, para se buscar soluções que sejam mutuamente aceitáveis e corretas entre os dois países”, afirmou Paulo Borba Casella.

Em coletiva de imprensa posterior, o próprio Lula comentou o assunto. “O Brasil não tem interesse que haja uma guerra na América do Sul. A nossa guerra é contra a pobreza e a fome. Se a gente não conseguir resolver o problema da fome e da miséria, como a gente vai fazer guerra? Para matar os famintos? Não dá para achar que tudo é resolvido à base da bala, que não é”, disse o presidente.

Após o encontro, Lula expressou boas expectativas em relação às negociações com os Estados Unidos. “Estou convencido de que, em poucos dias, teremos uma solução definitiva entre Estados Unidos e Brasil para que a vida siga boa e alegre do jeito que dizia o Gonzaguinha na sua música”, declarou.

Trump elogiou Lula e o parabenizou por seu aniversário. Por outro lado, não deu certeza sobre a suspensão das tarifas. “Tivemos uma reunião muito boa, vamos ver o que acontece. Não sei se alguma coisa vai acontecer, mas veremos. Eles gostariam de fazer um acordo. Vamos ver, agora mesmo eles estão pagando, acho que 50% de tarifa. E quero desejar feliz aniversário ao presidente, hoje é o aniversário dele. Ele é um cara muito vigoroso, na verdade, e foi muito impressionante”, disse o presidente estadunidense a jornalistas.

Tanto Trump como Lula manifestaram interesse em realizar visitas mútuas nos próximos meses. 

Cúpula da Asean

Nesta segunda-feira (27), o presidente brasileiro participou do último compromisso oficial na Ásia, a 47ª Cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático, bloco que reúne dez países, mais de 680 milhões de habitantes, e é visto como um parceiro estratégico. Essa é a primeira vez que um chefe de Estado brasileiro é convidado para a cúpula do bloco. 

Durante o encontro, o presidente voltou a defender a defesa do multilateralismo. “Somos países biodiversos, com culturas plurais, histórias entrelaçadas e desafios comuns. Partilhamos a convicção de que um mundo multipolar é mais propício à paz do que um planeta dividido por rivalidades estratégicas. Consideramos a cooperação um caminho mais promissor para a prosperidade do que a competição”, declarou.

“A aproximação entre o Sudeste Asiático e o Brasil, de leste a oeste, é crucial para a defesa do multilateralismo”, completou o presidente.

Lula voltou a defender transição energética e destacou o papel dos países asiáticos nessa direção. “A crescente produção de bioenergia no Sudeste Asiático torna a região um aliado natural nesse esforço”, destacou o presidente, sem deixar de mencionar, uma vez mais, o TFFF, fundo proposto pelo Brasil. “Um mecanismo inovador, baseado não em doações, mas em investimentos, que vai remunerar tanto os países que contribuem, quanto os que preservam suas florestas”, complementou Lula.

“Os países da Ásia do Leste têm em nós um parceiro confiável e comprometido com a construção de um mundo mais inclusivo e sustentável”, finalizou o presidente.

Durante sua estadia na Malásia, Lula se reuniu ainda com o primeiro-ministro de Singapura, Lawrence Wong, e com o primeiro-ministro do Vietnã, Pham Minh Chinh.

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