O SENTIDO DE FAMÍLIA, INTIMIDADE E AMIGO PARA DALLAGNOL QUE PERMITE TRIPUDIAR DAS MORTES DOS PARENTES DE LULA OU DE OUTROS

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“As pessoas têm que entender que essas conversas são conversas que você teria na mesa de casa com a família, são pessoas que estão trabalhando há cinco anos juntas, são amigas. São conversas que você tem com o círculo de intimidade, conversas que você fica à vontade para falar até alguma besteira, uma bobagem, para ser até certo modo irresponsável”, foram as palavras do procurador Dallagnol.
Essas afirmações não são ficções, mas verdades proferidas pelo chefe da força tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, em entrevista à BBC. Ele se referia aos cometários feitos por procuradores em relação as mortes de dona Marisa, esposa de Lula, seu irmão Vavá, e seu neto, de 7 anos, Arturzinho. Um espetáculo brutal de ausência dos princípios racionais como expressão de dimensão humana.
As afirmações de Dallagnol, nos remete para alguns exercícios intelectuais das ordens política, teológica, psicanalítica e ética. Na ordem política temos os enunciados formadores do conceito de família. No mundo ocidental a referência de família é o conjunto de corpus patriarcal, capitalista, paulino, burguês. Uma moral produzida pelo padrão homem branco, macho, europeu. Na ordem teológica o enunciado sagrado da moral eminentemente patriarcal cujo fator maior é a representação inquestionável da lei. Na ordem psicanalista o enunciado predominante é a triangulação da força edípica-paternal de onde se originam as neuroses e psicoses. Na ordem ética o enunciado ontológico da alteridade existencial como compromisso ontológico do ser.
Quando Dallagnol afirma “que essas conversas são conversas que vocês teria na mesa de casa com a família” ele apenas confirma a predominância das ordens: política, teológica e psicanalista. Todas encontram-se imbricadas. Não há como uma se separar da outra. É a própria materialização da consciência burguesa como fator de determinação como comportamento que não pode ser questionado. Uma família que se junta à mesa para tripudiar das mortes das pessoas não pode ser tida como pertencente a comunidade humana onde predomina a potência da verdade que é a essência da justiça. Aí, o sentido de família como movimento de afetos comunitários, não existe. Nessa mesa onde se culta a morte não há Cristo, visto que Cristo é vida. A mesa familial é o território dos encontros vitais. Mesa onde o tema é a morte, principalmente de pessoas que se tem como inimigas, é ritual macabro fúnebre que serve de sublimação da dívida com a existência. Sem se saber que comentar a morte de outros é a confirmação do medo da vida. Projeção de tânatos. O que é próprio do espírito burguês. Todo burguês tem pavor da vida.
“São conversas que você tem com o círculo de intimidade, conversas que você fica à vontade para falar até alguma besteira, uma bobagem, para ser até certo modo irresponsável”, diz Dallagnol. “O círculo de intimidade” é composto pelos mesmos corpus político, teológico e psicanalítico. A afirmação da tirania do modelo burguês de família capitalista, onde a mesma semiótica paranoica cliva cada personagem como reverberador de seus valores-molares. O filósofo Nietzsche chama de homens cativos. Aqueles que falam sem terem superado o que falam e se mantém sempre nos mesmos grupos de afinidades familiares, de profissão e de coleguismo. São os que jamais se aventuram a experimentar outros percursos que são estranhos de tão moldados que se encontram nos imbricamentos de suas intimidades. É por essa realidade que se pode “ser até de certo modo irresponsável.
Na ordem psicanalítica edipiana, a família é a materialização do discurso do pai. O discurso onde, pedagogicamente, se estrutura o sentido do que é privado e público. Mas, sem que os dois se mostrem diferente. Falar à mesa-familiar, não encobre as enunciações públicas. Basta apenas um pouco de atenção. Quem não percebia que por trás das performances do membros da Lava Jato comandada por Dallagnol, em parceria com as mídias-burgueses, havia o mesmo texto da mesa-familiar, da intimidade? Tudo que o site The Intercept divulgou já era visto, para além da percepção cristalizada, por muitas pessoas. Um discurso com exacerbações de moralidade, sacramentalidade, narcismo magnificado, revelava o interior familial-privado. O filósofo Sartre dizia que um dia o interior será exterior. Não deu outra: a turma de Dallagnol confirmou o amor de Simone de Beauvoir.
Dallagnol também se refere às pessoas “amigas”. É fácil entender essa afirmação pelo seu sentido contrário. O filósofo Nietzsche afirma que escravo não poder ser amigo, e tirano não pode ter amigo. O que o filósofo da Vontade de Potência quer dizer é que só pode ser amigo e ter amigo o homem livre. Tanto o escravo como o tirano não são homens livres. Ambos são ressentidos, daí serem medrosos. São os principais personagens do modelo político, teológico, psicanalítico do modelo-burguês. Amigo no mundo burguês é o que os estoicos chamavam de lecton: uma palavra sem sentido.
O que fica inquestionavelmente entendido, é que em suas afirmações Dallagnol só piorou o comportamento de si e de seus semelhantes que tripudiaram da família do preso político Lula.
Quanto a ordem ética como fundamentação ontológica do ser não há possibilidade de essencialidade histórica humana quando o tema é a morte. Porque, como diz o filósofo Spinoza o homem livre só fala da vida e não da morte. Mesmo que seja da morte dos outros. Ou, como afirma o filósofo Deleuze com Spinoza, falar da morte é sujo.