TEATRO UNIVERSITÁRIO NOS ANOS 100 ‘UFAMNISMO’

Teatro Cabocão 2 por você.

Uma Universidade é um corpus sistemático de ensino cujo objetivo social é difundir e preservar os saberes que constituem a imagem do pensamento do estado. Para tal, ela põe em atuação agentes, métodos, normas e crenças.

Como uma instituição social, para alguns; aparelho ideológico, ela carrega um organismo dividido em três partes pragmáticas:

Primeira Parte — A parte administrativa-jurídica, composta pela Reitoria, com suas sub-instâncias responsáveis pelo funcionamento técnico da administração, cujos métodos e estratégias são utilizados para fazer vigorar o pensamento do estado por meio dos conteúdos programáticos. Enunciação disciplinar.

Segunda Parte — A parte docente, com seus departamentos-administrativos, responsável pela aplicação, junto aos discentes, dos saberes instituídos como conteúdos programáticos disciplinares. Em relação à imagem do pensamento do estado, é a parte mais comprometida da instituição, já que para realização necessita tanto da crença do corpo docente como do corpo discente quanto às disciplinas. Pois, sabe-se que sua função pragmática visa unicamente disciplinar as mentes através dos saberes postos como verdades necessárias à preservação da sócio-cultura.

Terceira Parte — A parte discente, em quem a imagem do pensamento do estado procura ser refletida como verdades materializadas através dos conteúdos programáticos via atuação do corpo docente confirmadas no momento da diplomação.

SABER FORA DA CELEBRAÇÃO

Os saberes são corpos-signos instituídos como formas a serem tidas como verdadeiras. Se são necessários à preservação sócio-cultural, entretanto, não mais liberam potências criadoras em razão de se encontrarem tematizados como instrumentos à serviço da objetividade. Seus significados fazem parte da ordem dos clichês cotidianos. Servem para garantir o salário profissional, mas não servem para as transformações contínuas que a sociedade historicamente necessita.

Teatro Cabocão 1 por você.

Foi exatamente com o entendimento de que uma Universidade não deve ser apenas a transmissora inquestionável dos saberes imagem do pensamento do estado, onde os conceitos se encontram esvaziados de potências criadoras, que um grupo de estudantes criou em outubro de 1973 o GRUTA – Grupo Universitário de Teatro do Amazonas*. Uma potência/criativa/coletiva, tendo como principal fonte de produção os enunciados teatrosóficos políticos do alemão Brecht, que insistiu até os meados dos anos 80.

Com suas produções cênicas em cumplicidade com autores variados como Sófocles, Brecht, Gheon, Domingos Pelegrini, entre outros, o GRUTA, a revelia da inércia da Universidade, conseguiu estabelecer junto ao público uma textualidade social capaz de enredar a arte teatral em sua vida cotidiana como instrumento pedagógico de análise de sua condição no mundo. Mesmo sendo em tempos de ditadura. Um engajamento estético como Teatro de Encontro ao Povo. Um teatro que muito antes de Milton Nascimento, ia onde o povo estava nos passos e descompassos do Rui Brito, Marcos José, Marco Aurélio, Aparício Moraes, Dinair, Eurico Tadeu, Dinho, Socorrinho, Luis Marreiro, Ricardo Parente, Deise, Greco, Nonato Pereira, Humsilka, Luiza, Badejo, David Guarda-Belo, Silvio-Fuinha… Um grupo que se honrasse o tempo/cronos, com suas celebrações-pulsações, poderia afirmar que foi o único vetor da Universidade que levou seu nome junto ao povo como estética constituinte de novos desejos coletivos. Mas o GRUTA era intempestivo. Seus membros não eram simples alunos — sem luz —, simples crentes dos credos saídos das vozes de comando dos professores. Eram estudantes que acreditavam junto a Nietzsche, que de sua GRUTA poderia sair a potência da terra. 100 UFAMnismo, é claro.

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* A linha de atuação do GRUTA se encontra relatada no livro A Flecha do Teatro Cabocão, escrito por Marcos José e publicado pela Editora Universitária.

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