O dramaturgo e gramático gaúcho Qorpo-Santo escreveu no século XIX um decálogo de orientação jornalística, onde dizia que um editor tem que “conservar sempre certa firmeza de caráter, brio e dignidade. Que seja homem dotado de probidade e honra. Que tenha diante dos olhos mais o interesse público que o particular, não vendendo por isso mesmo as colunas de seu jornal a miseráveis, ou malignos especuladores”. Anunciava ele a possibilidade de um jornalismo democrático no Brasil moderno. O jornalista/filósofo Ignácio Romanet afirma que o jornalismo tem que ser uma disciplina cívica. Disciplina como um apanhado de noções/funções, e cívica como práxis pública, o que afirma os compromissos e implicações democráticas do jornalismo.

Todavia, mesmo com a profissão jornalística tratando e exigindo uma prática ética na atividade profissional, o que se ver são fatos totalmente contrários ao exercício do jornalismo ético. Principalmente quando uma notícia mostra-se mais equivalente ao jornalismo de mercado. Não importa que mercado. Mercado internacional, nacional, ou regional.

A IMPRENSA DE MANAUS NO CASO AMAZONINO

É sabido que a imprensa, de uma forma ou de outra, tem uma estreita relação com os governantes. Isso é notório em todos os quadrantes do planeta terra. Sempre há uma parcialidade a um governo, ou uma oposição para com outro. Mas o certo é que, observando a cobertura que imprensa de Manaus vem dando ao caso da cassação da candidatura do prefeito eleito, Amazonino, pela insigne juíza Maria Eunice Torres do Nascimento nota-se, sem qualquer esforço, que as enunciações de Qorpo-Santo e Romanet não vibram nem em um tênue eco nesse território comunicacional manoniquim.

Essa confirmação é sentida até por quem não compra jornal, e só ler as manchetes quando passa perto das bancas de revista. Quando a desembargadora Maria das Graças Figueiredo concedeu liminar para a defesa de Amazonino, todos os três principais jornais de Manaus estamparam, em destaque, manchetes sobre o caso. Manchetes que até extrapolavam da veracidade do texto da desembargadora. O Diário do Amazonas (“jornalismo independente”) destacou que a liminar garantia a diplomação e a posse de Amazonino, quando não era real. A Crítica (“de mãos dada com o povo”) destacava um novo round ganho por Amazonino, quando não havia ganho nenhum. O Amazonas Em Tempo, de propriedade de um amigo de Amazonino, não precisa nem comentar a exultação comunicacional. Quer dizer, todos estamparam manchete-uníssona que até os mais ingênuos perceberam que se tratava de um perigoso equívoco jornalístico. Para não dizer indiferença com a democracia jornalística.

Ontem, dia de comemoração dos 60 anos da Declaração dos Direitos Humanos, tema que a imprensa tanto alardeia em seu cristianismo, a juíza Maria Eunice Torres do Nascimento negou a liminar. Hoje, dia 11, os jornais A Crítica e Amazonas Em Tempo noticiaram na primeira página, mas em chamada diminuta, e sem o apelo contagiante da liminar, privilegiando outra informação que, talvez, tenham considerado mais relevante para o leitor ou, quem sabe, carregue mais força de sedução de compra. Ou então seus editores tenham visto nesse fato signos de maior força construtora de democracia que a recusa da Juíza. Já o Diário do Amazonas se ateu à nota interna na terceira página, ainda considerando a liminar como ação jurídica que permitia a diplomação e a posse de Amazonino, com disfarçada insinuação que não.

O certo mesmo é que a imprensa, não relevando o caso Amazonino à esfera da comunicação democrática, com imparcialidade, vem impedindo aos seus leitores a vivência jornalística cívica, responsável pela produção de cidadania.

1 thought on “A ÉTICA DA IMPRENSA DE MANAUS

  1. Este triste epsódio de desrespeito às leis democraticamente elaboradas, aprovadas e infelizmente não cumpridas, por políticos ultrapassados que afrontam o seu próprio eleitorado com apoio de segmentos do governo que deveriam dar exemplo, e ao invés disso apresentam comportamento leviano e colocam em risco a soberania nacional, com o agravante de ser a Amazônia uma das maiores cobiça internacional da atualidade, nos levando a crer que o Brasil não tem capacidade de administrar essa riqueza, pois os maiores destruidores dessa região em nível geral, são meia dúzia de brasileiros sem vergonhas e desprovidos de qualquer senso humanitário ou mesmo nacionalista. Esperamos ansiosos pelo desfecho desse epsódio o mais rápido possível e com parecer favorável à democracia, e que esses políticos que fizeram escola ao longo da ditadura militar sejam banidos da política nacional. FORA AMAZONINO COM OS SEUS DELITOS E SEU JEITO ULTRAPASSADO E SEM VERGONHA DE FAZER POLÍTICA.

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