CARTA DA ABGLT AO JURISTA IVES GANDRA MARTINS
O preconceito é uma idéia surgida de um equívoco da inteligência. Esta, é afetada pelo corpo-idéia que, modificando-lhe o modo de ser, faz com que este corpo-inteligência afaste-se de Si, engendrando uma consciência subjugada e supersticiosa. Assim, foi possível durante muito tempo que a “ciência” sustentasse o conceito de raça. E por muito tempo, desvinculadas de um enredamento social, capturadas pelos nós produzidos pelo modo de produção capitalístico, povos inteiros, mesmo sob o véu da democracia representativa, “escolheram” para si regimes ditatoriais. Assim o foi, por exemplo, na Alemanha nazista.
E sempre que esta dita superioridade, produto das desigualdades econômicas e sociais inerentes ao capitalismo, é ameaçada por parte da inteligência coletiva, que explicita e desmonta os argumentos falsos, os ícones da subjetividade do capital não fazem outra que não se apegarem desesperadamente às suas verdades, ainda que evidentemente não o sejam.
Assim, o jurista Ives Gandra Martins, branco e classe média (diríamos rico), professou os argumentos já conhecidos para sustentar uma “discriminação branca”. Vitupendiou, em nome da Lei (escrita pelos “brancos”, dos “brancos”, para os “brancos”), as chamadas minorias, ignorando que “brancos”, neste caso, não são aqueles de tez alva, mas todos os privilegiados historicamente pela opressão do capitalismo.
Ao citar os homoeróticos, Gandra deixa transparecer que não se trata de Direito ou de Lei, mas de manter as coisas em seus “devidos lugares”. Ou não serão os homoeróticos cidadãos comuns?
Como ação ativa diante da estreiteza intelectiva do artigo do jurista, a ABGLT divulgou para afiliadas e aliadas, carta em que coloca as coisas em seu lugar. O lugar do Comum.
Carta Aberta da ABGLT
ao Jurista Ives Gandra da Silva Martins
A ABGLT – Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais – é uma organização não governamental de abrangência nacional, que atualmente congrega 203 organizações afiliadas em todos os Estados brasileiros e tem como missão: promover a cidadania e defender os direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, contribuindo para a construção de uma democracia sem quaisquer formas de discriminação, afirmando a livre orientação sexual e identidades de gênero.
Neste sentido, a ABGLT vem posicionar-se a respeito das afirmações contidas no texto (abaixo) “Discriminação contra os Brancos”, datado de 03/11/2008, assinado pelo Jurista Ives Gandra da Silva Martins, em especial a parte em que afirma que “os homossexuais obtiveram, do Presidente Lula e da Ministra Dilma Roussef, o direito de ter um congresso financiado por dinheiro público, para realçar as suas tendências, algo que um cidadão comum jamais conseguiria.”
O reconhecimento da luta dos homossexuais, assim como da luta de todas as minorias sociais, culturais e políticas do nosso País, é um dever de todo e qualquer Estado que se defina como democrático.
O Estado brasileiro não pode permitir que todas as minorias (homossexuais, negros/as, mulheres, índios, pessoas com deficiência, etc) historicamente discriminadas e vencidas numericamente pela concepção política dominante da sociedade (que constrói a aparentemente neutra idéia de “cidadão comum”), mas que a rigor é homem, branco, heterossexual, de classe média ou alta, escolarizado, cristão, sendo ademais machista, racista e homofóbico, continuem sem ao menos contar com instâncias legítimas para a reivindicação de seus direitos através do reconhecimento de sua diferença, que clama não por privilégios, mas por respeito à sua dignidade de cidadãs e cidadãos.
Entendendo a necessidade de equiparar social, cultural, jurídica e politicamente essas minorias para que tenham voz, vez e espaço dentro da sociedade em geral e das esferas de poder em particular , cabe ao Estado a criação das chamadas Políticas Públicas Afirmativas, as quais sem perder de vista seu caráter universal, também não deixam de atentar para as especificidades destes segmentos da população.
Um dos mecanismos utilizados pelo Governo Lula para a criação dessas políticas públicas são as conferências nacionais, convocadas para debater as mais diversas temáticas sociais como saúde, educação, comunicação, meio ambiente, entre outras. No caso da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), foi organizada a I Conferência Nacional GLBT, onde pela primeira vez no mundo um Presidente da República e seus Ministros dialogam com esta população para ouvir suas demandas sociais, tendo como finalidade a garantia de sua cidadania e participação na sociedade.
A realização desta Conferência é marco máximo da democracia, pois demonstra que o Estado percebe e reconhece a diversidade existente no seio da sociedade brasileira, deixando de tapar o Sol com a peneira do “cidadão comum” abstrato, trazendo ao debate a chaga social que é o preconceito e a discriminação que tolhem direitos e relegam um contingente enorme de seres humanos à categoria de “cidadãs e cidadãos de segunda classe”. O Estado brasileiro não pode mais se calar diante da violência homofóbica que, no Brasil, mata um homossexual a cada dois dias.
Caminhar contrário à implementação dessas políticas e não reconhecê-las como legítimas demandas expressas por vozes que foram frequentemente caladas, isso sim, é atentar contra os valores democráticos da convivência harmoniosa propugnada pela cultura de paz, fruto do Estado de Direito.
A ABGLT luta e continuará lutando para garantir que as vozes de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais sejam sempre ouvidas, pois só uma sociedade democrática, em que a diferença seja vista como um valor e não como uma ameaça, poderá garantir efetivamente a dignidade, a liberdade, a justiça e a felicidade a que todas e todos têm direito. .
Atenciosamente,
Toni Reis
Presidente da ABGLT
Desculpem-me mas parece ser mais uma daquelas bobagens que alguém escreve e coloca o nome de uma pessoa famosa. Acho que o Ives Granda jamais escreveria tamanha bobagem. Abraços.