2ª REUNIÃO DA CARTOGRAFIA DOS CULTOS AFRO NO AMAZONAS
No domingo passado, (21) reuniram-se na sede da Federação de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros do Estado do Amazonas, situada a rua Pintassilgo, nº 100 – Cidade Nova II (Manaus), representantes da Umbanda, Candomblé, Mina e outros cultos afro-brasileiros para sua segunda reunião de levantamento da quantidade de terreiros que existem em Manaus, para promover a integração destes terreiros e conhecimento das principais dificuldades encontradas cotidianamente nos terreiros e pelos adeptos das religiões afro-brasileiras.
Após as orações e as palavras de Mãe Emília de Toy Lissa, presidente da Fucabeam, os trabalhos começaram, puxados por Flor (da Fucabeam) e Gláucio da Gama, pesquisador da Ufam e membro do Fopaam, que lançaram três questões para serem discutidas pelos participantes.
Em seguida, foram formados vários grupos de discussão, que se espalharam pela ampla área verde de Mãe Emília, onde funciona a sede da Fucabeam, e conversaram acaloradamente entre si sobre as questões apresentadas, enquanto produziam painéis para apresentar sucintamente seus pontos de vista.
Enquanto os diversos grupos preparavam seus painéis, conversamos com Gláucio sobre esse trabalho com os cultos-afro.
Sou Glaucio da Gama Fernandes, estou como pesquisador da UFAM, do Departamento de Antropologia, e também pelo Fórum Permanente Afro-descendente do Amazonas – FOPAAM, sou membro da coordenação e estou ajudando a fazer esse trabalho junto à FUCABEAM. O trabalho tem um objetivo, que é trabalhar a questão da liberdade de culto religioso, como diz a própria lei, a liberdade de culto religioso, os locais de culto, as liturgias, despertar a consciência dos afro-religiosos sobre o direito que eles têm de manifestar a fé. Assim como o cristão católico e protestante tem a liberdade de se manifestar e fazer os seus cultos, suas cerimônias, os afro-religiosos também tem esse direito de fazer a sua religiosidade. E o projeto A Nova Cartografia também tem como objetivo fazer um mapa cartográfico, partindo dum ponto central, que é a Fucabeam, e mapeando onde estão as casas de santo na cidade de Manaus. Vai constar num mapa onde estão situadas as casas que são federadas pela Fucabeam. A gente sabe que não é só a Fucabeam que existe como federação de cultos afro, existe a Abucabam, a Fenecabi e o Carma. E estão aí justamente pra fazer um trabalho de valorização, de afirmação da identidade afro-religiosa.
Esse trabalho tem alguma representação em interiores ou por enquanto só em Manaus?
Esse projeto Nova Cartografia Social da Amazônia é feito em todo o Brasil, na região norte, nos estados do Amazonas e Pará, tem saído fascículos a respeito dos movimentos sociais e religiosos, tudo voltado pra outros estados. Será feito o lançamento na Universidade Federal do Amazonas, nos espaços públicos e também a própria Ufam leva pra outros estados pra apresentar os fascículos que foram produzidos em Manaus, no estado do Amazonas e no interior também. Na Fucabeam existem federados não só aqui de Manaus, tem em Itacoatiara, em Nhamundá, tem Manacapuru. E a Fucabeam é também federada a uma ordem nacional em São Paulo. Então o trabalho vai visibilizar não só aqui em Manaus, mas em todo o Estado brasileiro.
A partir desse trabalho gera um conhecimento muito grande da relação dos terreiros que vão ficar mais conhecidos e vão se fortalecendo. Mas tem algum dispositivo de intervir politicamente, como mudanças de legislações…?
Nesse sentido, a federação, pelo que eu sei, tem um projeto político que no caso trabalha com a questão social e diante dessas iniciativas ela faz a sua questão política com a comunidade, principalmente, e com os federados. É ela que muitas das vezes libera alvará de funcionamento, é ela que tem o poder de fechar alguma casa se tiver irregular, que tiver acontecendo coisas que é fora do normal do culto.
Pode defender também…
Isso, pode defender. Existe um conselho na federação de advogados, que, quando tem algum problema, se a comunidade cria algum problema com alguma casa de santo, tem os advogados pra responder por eles. Então, nesse sentido, eles estão bem amparados e isso é bom porque dá uma certa credibilidade. O que eu tenho observado como pesquisador: existe muito terreiro aqui em Manaus, porém eles não tem conhecimento, muitas vezes, e não querem se filiar às federações. Uma coisa que não acontece da noite pro dia. Eu ouço muito falar que tem pai de santo que não era pra ser pai de santo porque tem todo um processo de estudo, toda uma preparação, e se não faz a preparação a gente corre o risco de ver o charlatanismo que tem. Quantos e quantos não usam a fé pra se sobressair, pra se prevalecer. E isso é muito sério. Acabam também desqualificando o trabalho daqueles que fazem com coerência, com respeito, é uma questão sagrada.
Tu estudas antropologia?
Na realidade eu sou professor da rede municipal, de ensino religioso, atualmente eu estou fazendo uma especialização em história e cultura afro-brasileira, pela faculdade Tahiri, no São José e esse trabalho que eu tô fazendo aqui já vai me ajudar no meu trabalho final da especialização. Enquanto os meus colegas não querem fazer nada voltado pra religiosidade porque eles têm aquele tabu, aquele medo, eu tô de pé atolado nos terreiros. E é bom justamente pra desmistificar até que ponto aquilo que se diz na sociedade, que se fala: “Ah, porque é macumbeiro, porque despacha…”. Não. Tudo tem uma simbologia, tudo tem um significado. Que história é essa de dizer, de onde partiu essa idéia de dizer que o teu nome vai pra boca do sapo e vai ser amarrado? É preciso desmistificar essas coisas que se falam e que acabam sendo incutidas dentro da cabeça das pessoas e sendo veiculadas, transmitidas como preconceito, como discriminação, e não é. É preciso conhecer. Se a gente não conhece, a gente corre o risco de viver na ignorância, na intolerância religiosa, principalmente, que é tão forte aqui no Amazonas. Porque em outros estados a gente não percebe, eu pelo menos, a leitura que eu tenho, a gente não vê tantos conflitos em questão religiosa em outros estados. O Amazonas, eu não sei, a gente precisa ainda fazer um estudo sobre por que as coisas aqui são tão difíceis, por que as pessoas dificultam as coisas, principalmente nesse aspecto.
Com esse trabalho talvez diminua…
É justamente o trabalho, o projeto da Fucabeam no sentido da Cartografia é apresentar à comunidade e à sociedade manauara como é que é, como é que acontece a questão do culto e o que oferece pra comunidade. Porque a gente sabe que os terreiros são espaços públicos, a comunidade vem em busca de auxílio. E tem uma coisa muito séria que eu já percebi que as pessoas vivem doentes e a doença delas muitas vezes é espiritual. E quem é que vai tratar? É o médico, aquele formado na medicina? Não, porque nunca a medicina vai descobrir o que é doença espiritual. E quem é que vai cuidar disso? São os afro-religiosos, que são muito experientes nessa parte. Tem até um projeto de lei pra se reconhecer as casas de Umbanda, o culto, como o espaço de cura, porque não deixa de ser.
Então os grupos já haviam terminado os debates, todos voltaram para o interior do barracão, onde cada um passou a apresentar seus pontos de vista, analisando cada uma das questões e colocando problemas e sugestões, que serão incluídas no fascículo a ser produzido pela Cartografia. Colocamos aqui alguns trechos das falas de representantes de cada um dos terreiros presentes que se manifestaram.

Nós chegamos à conclusão que o preconceito, em primeiro lugar, muitas vezes parte de nós mesmos, dos próprios umbandistas, e também da falta de conhecimento dos próprios adeptos, de pessoas envolvidas na religião, para depois se generalizar. Esperamos que a Cartografia traga conhecimento para nós mesmos e para toda a sociedade.
.
.
.
.
.
Nosso trabalho espiritual exige todo um aprendizado. Não é da manhã à tarde que se faz um pai de santo. A folha cura, mas depende de como é utilizada. Existe toda uma técnica. Eu estou feliz aqui e na minha religião, o preconceito, eu espero que não seja vulgarizado.
.
.
.
Sobre os preconceitos que sofremos na nossa religião, são de duas formas: de discriminação e de exploração. Na primeira, ocorre a discriminação religiosa e social, que é a pior de todas, família, amigos, trabalho, política. Por exemplo, na roda de amigos ou no trabalho nós não podemos dizer que somos da Umbanda, porque sofremos preconceito. Nós esperamos nessa Cartografia, da sociedade em geral, das comunidades de outras religiões que as religiões afro são como outras religiões. No caso das ervas, nosso terreiro é pequeno, é uma pena que não possamos plantar as nossa plantas, precisamos ir a uma área rural para comprar nossas ervas.

Nós somos da Casa de Mina Jeje Nagô, Zé Pelintra. Nós sofremos muitos preconceitos de outras religiões, principlmente da evangélica, que sempre acha que nossa religião é coisa do demônio. Preconceito cultural perante a sociedade, nossa sociedade é preconceituosa não somente à nossa religião não, mas a tudo. Nós esperamos com essa Cartografia, o reconhecimento perante a soicedade como um todo. Eu espero que meu pai, minha mãe, que meu vizinho respeite a minha religião. Porque, por exemplo, às vezes eu tenho um marido e ele não valoriza a minha religião. Como, então, o meu vizinho vai valorizar? Também acredito que é papel dessa Cartografia ampliar a divulgação das religiões afro-brasileiras para melhorar o conhecimento sobre elas. Porque, se alguém é pastor, não é por isso que ele conhece tudo da bíblia. Nós não conhecemos tudo da nossa religião. Nós vamos parendendo um pouquinho a cada dia.

A discriminação é feita por muitos, que não nos respeitam, as nossas diferenças. Um dos papéis da Cartografia é divulgar a nossa religião, para sermos respeitados. No nosso barracão, nós também não temos espaço para fazer plantação, então nós compramos nos mercados e feiras.
.
.
Nós, da Fucabeam, enfrentamos uma resistência muito grande das próprias pessoas do culto em se filiar, em se envolver para dar uma opinião, a ajudar os próprios irmãos, e sobre os fundamentos da religião, temos um preconceito muito grande no interior da religião no que se refere à hierarquia, alguns porque tem dois, três anos não querem respeitar os mais velhos na religião. Nós temos muitas dificuldades também nas instituições, em acesso a hospitais. A pessoa às vezes precisa de uma visita espiritual; nós temos muitas pessoas da igreja católica, de igrejas evangélicas, mas não vemos pessoas das religiões afro, um pai de santo, um babalorixá. Um exemplo, faleceu um irmão de santo nosso aqui do terreiro da Mãe Emília, e quando ele ainda estava no hospital, ela pediu pra eu ir visitá-lo, como ele estava na UTI, a médica não quis passar nem informação sobre o estado em que ele se encontrava, pelo fato de eu dizer que era irmã de santo dele. Então ela achou que eu não tinha valor nenhum, que só a família biológica tinha direito de saber sobre a saúde dele. Foi um preconceito muito grande com a nossa religião. Outro exemplo, quando a Mãe Emília foi abrir uma conta na Caixa Econômica, o gerente, só de saber que a Mãe Emília estava abrindo para a Fucabeam, ele pediu 5 mil reais para abrir a conta. Esperamos que com essa Cartografia, as pessoas venham a conhecer e se envolver mais com a religião. Nós, da Fucabeam, esperamos um reconhecimento tanto dos governos quanto das outras pessoas de outras religiões. Esperamos há muito tempo para fazer uma área verde para os orixás, o projeto do Parque dos Orixás, que todos os pais de santo, mães de santo pedem para que sejam feitos os trabalhos. Como todos estão vendo, aqui no terreiro de Mãe Emília há uma área verde muito grande, de modo que a maioria das ervas que precisamos para cura, para obrigações são retiradas daqui mesmo. Quando nós temos aqui, compramos ou falamos com um irmão que tenha.

A sociedade conhece pouco da religião afro-brasileira. Então ela prejulga e julga. Acredito que grande parte do preconceito que sofremos vem do desconhecimento da sociedade. A partir do momento que a sociedade conhece, ela passa a quebrar com os preconceitos. Eu não quero apontar o dedo, mas quem fez esse preconceito, ele vem da época da colonização do Brasil. Com a chegada da reliugião católica. Com a chegada dos escravos, trazendo a religião africana para o Brasil, fomos atacados pela sociedade portuguesa da época, e até hoje isso vem se arrastando. Que a sociedade vá conhecendo um pouco da religião, para que vá diminuindo o preconceito e a discriminação. Não temos nenhum espaço na mídia, não tem um canal de televisão, uma emissora de rádio onde se mostre um programa sobre as religiões afro. O espaço na mídia é muito restrito, temos apenas algumas revistas, alguns sites. Por incrível que pareça, mas a mídia só procura um zelador de santo, um sacerdote, os babalorixás no final do ano para prever o futuro do ano seguinte, fora isso não temos espaço. Essa Cartografia vai servir como um meio de transporte, como um meio de divulgação, vai levar para outras pessoas o que realmente acontece nos cultos afro-brasileiros. A Cartografia deve servir de elo entre os cultos afro-brasileiros e a sociedade. Quanto às ervas que usamos, existem em quase todas as feiras e mercados boxes especializados nessas ervas curativas e para as obrigações. Mas sempre tem algumas ervas que nem é possível plantar na nossa região, devido ao nosso clima tropical. Colocamos aqui o nome de algumas ervas que utilizamos no dia-a-dia; elas tem o nome científico, mas colocamos aqui os nomes populares: a corama, a babosa, o crajiru, a fruta do abacaxi, o limão, o boldo, o pobre-velho, a canela, a papoula, sacaca, jurema, mastruz, o leite-do-amapá, a raiz do açaizeiro, a imbaúba e muitas e muitas outras ervas.
Ao final, várias pessoas fizeram suas considerações, e tomamos as sábias palavras de Mãe Emília, que fez a avaliação dessa segunda reunião da Cartografia.
Hoje foi um dia pra nós muito bom, muito aproveitável de tudo aquilo que foi feito. nós escrevemos, nós falamos sobre o preconceito e essas coisas, foi ótimo, maravilhoso. Então pra mim foi um grande dia, foi um grande objetivo que nós enfrentamos e tamos conseguindo, realmente a gente fez aquilo que a Fucabeam precisava fazer, sobre o preconceito, a luta, a batalha. Estamos mais de seis anos batalhando, estamos realizando exatamente tudo aquilo que a Fucabeam precisa fazer. Esse projeto que nós temos, já entregamos no governo, o nosso santuário sagrado, tudo isso a Fucabeam realiza. A escola das crianças que nós temos aqui de futebol, dos meninos de rua, tudo isso, dos colégios. Tudo isso a Fucabeam, nós estamos conseguindo botar tudo em dia, não só a vida espiritual, mas também a vida social do povo que procura esta casa em busca de tudo pros seus filhos, pras suas crianças. Tudo aquilo que nós pensamos nós estamos conseguindo.
Mauricio, ficou muito bom mesmo o trabalho que você registrou… parabens !!!
Esperamos contar com você na ultima oficina.
Um abraço…
gostei da cartografia de vcs…
parabens p/ Mae Emilia pelo seu trab. social
continuem a persistir nessa luta…
somos todos filhos do Mesmo Pai Supremo Criador só q muitas pessoas não tem Deus no coração, por isso falam e fazem besteira,
não desanimem, na vida temos q fazer a nossa parte em “Amar o próximo, como Jesus Amou”…
É o que nosso Pai Oxalá quer q ajudemos uns aos outros…
Axé para todos aqueles que fazem o BEM…
Pai Oxalá abençoe a todos nós…
O projeto cartografia social dos afros religiosos de belém
do pará,no mapeamento das casas mães das nações do jeje-angola pajelança ketu mina,foi um trabalho ardu principalmente o de campo,eu vejo assim como um desafio comquistado,e agradecemos a fundaçaõ FORD,e as professoras da universidade e das bolcistas
a familia fundere oya jokolosy pede a oludumare,que proteja a todos.
gaiacu jokolosy jeje savalu.
LENÇOIS PAULISTA -SP ,,,SOFREDORES,,,,PODER CRUEIS ,