Claro que é, pois deixa passar por seu corpo os fluxos das potências naturais intempestivos e incapturáveis. Mas apenas nessa relação de vizinhança. Mas não como imitação, nem relação entre dois termos de uma sentença, seja como metáfora ou como comparação; simplesmente numa relação de proximidade, numa zona de indiscernibilidade onde salta um ser anômalo: devir-anta. Quando o amestrado da Veja, Diogo Mainardi, escreve Lula é minha anta, antropomorfiza um e animaliza outro a partir de um abstracionismo fictício próprio daqueles que vivem na superstição e jamais conseguem chegar ao real. Mainardi conhece uma anta? A anta é considerada o maior mamífero brasileiro, é um animal que habita charcos, onde se banha para espantar insetos que tentam perturbá-la, é herbívora, vive constantemente solitária e tem três dedos nas patas anteriores e nas dianteiras um pequeno dedo a mais. Tudo a ver com Lula. Como ela, Lula habita a lama da política brasileira e nela se banha para escapar à sanha dos impotentes parasitas da direita cansada e poder governar. É isso que Bertolt Brecht coloca quando insta a mergulhar no lodo, mas transformar o mundo (abaixo). Mainardi leu Brecht? Se leu, foi além da decodificação abstracionista das letras ou apenas preencheu lacunas com sua existência de sujeito sujeitado dos Civitas? Política herbívora de Lula que, a despeito de todos que tentam encurralá-lo, a direita golpísta e a mídia seqüelada, ele não as ataca como poderia, apenas mergulha na água, como a anta, mas cada vez que bóia traz uma novidade: é a diminuição do índice de pobreza, uma infinidade de projetos sociais como nunca se viu deste lado do oceano, é a valorização do real em 100% nos últimos cinco anos, etc, etc. O playboysinho que se pretende carnívoro, Mainardi, sabe mergulhar nos rios turbulentos? Ou apenas se ilude, querendo-se transgressor apenas por urinar nas águas calmas das piscinas da elite ressentida? Como uma anta, Lula vive solitário, muitos que estavam próximos a ele, partidários e familiares caíram nas armadilhas, mas a cada tentativa de incriminá-lo ele aparece íntegro, incorruptível. E no devir-animal que o atravessa ele está em bando, populações inteiras, multiplicidades de afectos e potências onde todos os animais, todas as minorias vão formar um agenciamento coletivo de enunciação. Mainardi sabe que sofre das piores doenças do ser: um corpo frágil e uma alma débil, não podendo deixar vacilar seu eu dos sentimentos pessoais, e a palavra “público” em sua boca não passa de uma forma significante autoritária, por isso o possessivo “minha” como força de dominação da maioria? Mas isso é também uma quimera. Um devir está sempre em outro lugar. Em seu corpo-tapir, Lula fuça em sua singularidade e se aproxima das infinitas singularidades do povo a partir das noções comuns necessárias à prática democrática. Tudo isso é imperceptível aos “encéfalos esponjosos”, conforme a expressão de Jean Baudrillard. Provavelmente Mainardi colocou como título de seu livro Lula é minha anta devido ao dedo que ele acredita que Lula tem a menos. Seu ídolo FHC também já usou esse artifício preconceituoso, quando colocou uma mão “completa”, com os cinco dedos como símbolo de sua campanha em 1998. Mainardi e FHC, tudo a ver, não sabem que ser cego não é a ausência de visão, é uma outra subjetividade. Tudo a ver com a Veja, a Globo, os tucanados, mas não comigo, nem com você. A Lula, além desse dedo não lhe representar uma falta, como gostariam os psicanalistas, ele é a presença constante da sua luta como operário, da luta dos operários, e, além disso, Lula sabe que essa outra subjetividade desconcerta o já posto, o constituído como verdade e realidade, por isso mela a mão esquerda com o óleo para deixar sua marca na Petrobras que por sinal já estaria privatizada se os tucanos tivessem ganhado em 2002 — como um enunciado de resistência. A mesma mão que apareceu apertando o botão da inauguração da Record News, que vem ao menos para quebrar o monopólio globólálico. É como uma ferroada na sensível e flácida pele da elite invejosa e ressentida. Mais uma vez tudo a ver com a anta. Mas Lula não ferroa ninguém. Dificilmente Mainardi sabe que a unha da anta é usada popularmente para curar vários tipos de doenças e os índios a utilizam para tratar até epilepsia. Será que o quimiopasteurizado Mainardi tem preconceito também à medicina popular, aos saberes dos índios e cabocos? Pode-se dizer que Lula é também um curandeiro, um devir-cura um devir é sempre uma heterogeneidade —, e utiliza seus saberes populares para fazer sarar esse corpo-Brasil tão acometido de mazelas de Cabral a FHC. Mainardi segue a tradição da crítica literária, que mostra a semelhança comparativa entre homem e animal sempre como uma degradação, como analisam em Vidas Secas, de Graciliano Ramos, quando o personagem Fabiano diz de si mesmo: “Fabiano, você é um bicho”. Mainardi e os críticos não tem como compreender que o “bicho” é o virtus, a potência que pode atualizar a essência do ser em uma ação. Como um gato doméstico, roçador, que de vez em quando rosna como a onça e ataca como um maracajá. Mainardi quer ficar apenas como um gato antropomorfizado e sua ração diária. Ele se quer um outsider, mas não passa de um gato burguês, cansado, dorminhoco, porque nunca está acordado. Quer tirar sarro, mas não sabe o que é um almoço dos operários. O filósofo francês Gilles Deleuze diz que todo homem tem um buraquinho por onde pode passar a inteligência; mas Mainardi, no seu hominismo, só tende a tapar cada vez mais esse buraquinho. Mudando a pessoa do discurso, você, Mainardi, não é como uma anta. E atualizando a questão inicial, Lula não é uma anta. Lula é como uma anta: uma outra coisa, anômala, imperceptível, incapturável, real, uma matilha, uma coletividade, um devir…

Com quem o justo se recusa a ir à mesa
Se se trata de ajudar a justiça
Que remédio pareceria demasiado amargo
Ao moribundo?

Que baixeza você recusaria cometer
Para extirpar toda a baixeza?
Se você pudesse transformar o mundo, o que
Você não aceitaria fazer?

Quem é você?

Mergulhe no lodo,
Beije o carniceiro, mas
Transforme o mundo.
Ele precisa ser transformado.

                            Bertolt Brecht

12 thoughts on “LULA É UMA ANTA?

  1. Caralho… Quem escreveu isso é um completo esquizofrênico. Deleuze, Guattari e outros idiotas deveriam ser proibidos para jovens de fraca constituição moral e existencial…

  2. Parabéns, Flavinho,
    Mainardi vai lhe dar um doce. Você conseguiu ao menos formular um palavrão, ainda que num momento de estupefação. De qualquer forma é uma possibilidade de saída da normalidade cotidiana que elege a estupidez como inteligência. É uma pena que, pelas reticências, você não tenha tido força de soltá-lo em alto e bom som, o que os psicanalistas apontariam ainda como um rescaldo de recalque e paranóia. Mas não ligue, na verdade são decalques. Você chega lá na esquizofrenia, na multiplicidade do ser, como dizem Deleuze, Guttari, e também Spinoza, Baudrillard, todos esses idiotas que não compõem com o estado de coisas constituído em posições morais e existenciais rígidas. Tente de novo e Veja que você consegue.
    Parabéns!

  3. O Lula não é uma anta, longe disso, o Lula é uma Besta do Apocalípse, é o anti-cristo brasileiro.
    Quem viver, verá!

    1. Olhamdo pelo lado en que a Anta mergulha para se proteger dos. parasitas,carapatos,da politica,e do patrimonio publico,Vamos criar uma organizaçao governamental,para preservaçao das Antas,para que ela nunca fique solitaria,a nao ser por vontade propria!!!

  4. Não adianta! Os adeptos do tempo futuro perfeito, os fundamentalistas do messianismo marxista, estes idiotas “criminosos” que acreditam numa futura sociedade de Anjos e não de homens, sofrem de uma séria doença mental. Alguns, suspeito eu, precisam recorrer à um Exorcista; é uma doença do espírito, é uma luta espiritual, uma luta contínua contra a vaidade – a vaidade de achar que é um eleito, um ser ungido e com poderes de mudar o mundo à sua imagem e deformação.

  5. Eita, ante(a)nados,
    Cristo não era nem é messiânico como queria Paulo. Cristo era marxiano antes de Marx, e por isso não cria em uma sociedade nem de anjos dessexuados nem de humanos demasiados humanos, como diria Nietzsche. Aqueles que, não vendo sequer seu umbigo, ficaram na imaginação e no misticismo, os mais baixos graus do conhecimento, por isso impedidos de chegar ao real, o que só é possível em comunalidade.
    Por isso, é bom encontrá-los por cá, avisem os amigos, cachorro, periquito, papagaio, não esqueçam das antas, que com certeza, como potência democrática, vamos deformar o mundo espiritual dos pacatos e passivos burgueses, e nessa a classe-média vai junta, para fazer emergir um Outro Mundo onde os tiranos, os preconceituosos, os corruptos não possam moldá-lo à imagem de seus rostos ignóbeis…
    Vamos nessa, moçada!

    1. Nunca foi numa missa, nunca leu a biblia e nem sabe do que tá falando.
      Engraçado você falar em tiranos e preconceituosos. Você os apoio e está louco para ver a ditadura do proletariado violenta e sanguinarea.
      Você não passa de um psicopata assassino, louco para comandar um pelotão soviete nas ruas sangrando todos os malvados burgueses que você encontrar.
      First and last time on this blog.
      Adios muchacho!

  6. Anônimo muchacho,
    como diz o bolerão, “não se vá”!
    E não tema.
    Filósofos não pegam em armas.
    Só argumentos, mechacho, não vês?
    Aqui não há imprecações nem censuras nos comentários.
    Aqui não precisaremos andar como reza a missa e a bíblia um tratado geográfico-político.
    A melhor parte é a história de Cristo contada por Mateus e Lucas. A pior é o arremedo de Paulo de Tarso.
    Oh!, muchacho, é uma pena que você se foi.
    Desejaríamos entabular conversações.
    Se resolver aparecer por aí, não precisa bater na porta. Nosso cachorro é daqueles de brincar com as crianças, assim como a gente…
    Abraços afinados!

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